quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Libertações em boate: exploração sexual, dívidas e escravidão

Por Bárbara Vidal

Mulheres sexualmente exploradas e impedidas de sair de uma boate - a não ser mediante pagamento - foram libertadas em Várzea Grande (MT), município vizinho à capital Cuiabá (MT). Além das 20 jovens do sexo feminino, quatro homens também foram encontrados em situação degradante e submetidos a jornadas exaustivas, itens que caracterizam o trabalho análogo à escravidão (segundo o art. 149 do Código Penal).

Mantidas em alojamentos precários e superlotados no interior da casa noturna Star Night, as mulheres eram obrigadas a ficar praicamente 24h à disposição dos donos do estabelecimento, situado na região do "Zero Km", a pouco mais de um quilômetro do centro de Várzea Grande (MT) e a cerca de um quilômetro do Aeroporto Internacional Marechal Rondon.

Sem direito ao descanso semanal remunerado garantido por lei, elas não folgavam nem aos domingos e feriados. Algumas chegaram a assinar um contrato que vedava a própria saída do local de trabalho caso não houvesse a quitação de pagamentos combinados. Segundo Valdiney Arruda, que comanda a Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Mato Grosso (SRTE/MT) e acompanhou a ação, as mulheres "viviam em regime total de subordinação [frente aos empregadores]". "Além da exploração sexual, elas ainda eram obrigadas a fazer shows de strip tease como cumprimento da jornada de trabalho", complementa o superintendente.






O salário era "pago" por meio de "fichas", vales que eram trocados por produtos (como cigarros e bebidas alcoólicas) e também por alimentos (como pacotes de macarrão instantâneo), que eram vendidos com preços superfaturados na "venda" instalada no interior da própria boate.

"Identificamos a sujeição dessas trabalhadoras também pelas dívidas [contraídas nesse "comércio" interno], que eram controladas pelo caderno do empregador", disse Valdiney. Elas eram incentivadas a incrementar a venda de produtos, pois recebiam comissão. Nenhum dos libertados tinha registro na Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS).

O cerceamento era induzido, de acordo com o auditor fiscal do trabalho que coordenou a ação, Leandro de Andrade Carvalho. No caso, as vítimas oriundas de cidades de outras regiões de Mato Grosso, de Goiás e até de São Paulo foram atraídas por meio de "um aliciamento brando".

Operação
Além de precários e superlotados. os espaços ocupados pelas mulheres não tinha ventilação adequada nem proteção contra incêndio. Pertences pessoais, como sapatos e sandálias, estavam espalhados pelo banheiro (foto acima). Foram constatadas instalações sanitárias completamente inadequadas que não respeitavam normas de higiene. Por causa de tudo isso, os alojamentos foram interditados pela fiscalização trabalhista.

Os quatro trabalhadores (um gerente e três garçons) não ficavam acomodados na boate e retornavam para suas casas após o expediente. Mas foram libertados, pois enfrentavam condição precárias e desumanas, com jornadas exaustivas e sem descanso regular. Todas as vítimas tinham entre 18 e 23 anos de idade e trabalhavam na Star Night.

Batizada de Atena II, a operação contou com participação de diversos órgãos como Polícia Civil, Guarda Municipal e Conselho Tutelar e foi realizada entre 18 e 19 de novembro. Participaram ainda integrantes da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp) e da Comissão Estadual de Erradicação do Trabalho Escravo do Mato Grosso (Coetrae-MT).

Embora tenha sido realizada no mês passado, as investigações sobre os crimes na região do "Zero Km" de Várzea Grande (MT) se iniciaram pelo menos quatro meses antes, devido a uma denúncia de ocorrências de trabalho infantil. Desta vez, porém, não houve flagrantes de situações de risco nem de exploração sexual envolvendo crianças e adolescentes.

A proprietária da casa noturna, Cleiva Alves da Silva, acompanhou a fiscalização. Foram lavrados 21 autos de infração e ela foi notificada a pagar as verbas trabalhistas que somaram mais de R$ 331 mil.

As vítimas foram orientadas para que retornassem a seus municípios de origem e receberam o Seguro-Desemprego do Trabalhador Resgatado. Houve ainda uma explanação sobre a situação de ilegalidade, feita pelos agentes públicos, aos envolvidos. "Coibir esse tipo de tratamento dessas pessoas resulta em outros resultados. Depois dessa ação, diminuiu o índice de violência no local, de acordo com a Polícia Civil", declarou Valdiney.

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Nós somos as mulheres que os homens alertaram



Em breve, matéria sobre este festival.

Como funcionam as rádios comunitárias na Venezuela? Confira a reportagem



Renan Justi e Maísa Tomaz


“Nós somos a expressão da liberdade”, define Carlos Lugo, coordenador da rádio Negro Libre Primero (101,1 FM), numa manhã de domingo em Caracas. É com este espírito ideológico que as mais de 244 rádios comunitárias da Venezuela atuam, acreditando na força do meio de comunicação para promover a tão desejada transformação socialista no país.

Desde o fracassado golpe de Estado promovido pela oposição em 2002, o ex-general militar Hugo Chávez difunde sua ideologia política, principalmente, pelos meios de comunicação públicos, como o jornal Ciudad CSS, a emissora Telesur, a Radio Nacional de Venezuela, entre outros.


Locutores na rádio Ali Primera (crédito: Maísa Tomaz)
Rádios comunitárias
O processo “revolucionário”, que, segundo os chavistas, a Venezuela atravessa, tem apoio massivo das rádios comunitárias, com transmissão sustentada pelo eleitorado mais fervoroso do presidente, as classes baixas.

Estas rádios comunitárias, em grande parte, possuem como principal objetivo a propagação dos ideais socialistas do bolivarianismo, os quais se valem da concepção de que os países latino-americanos devem emancipar-se da dependência do capital norte-americano e europeu, nações que, na visão de Hugo Chávez, exploram a classe trabalhadora por intermédio das super lucrativas multinacionais.

“Nós somos revolucionários, acreditamos que para construir uma sociedade mais justa há de se trabalhar, formar as pessoas, nos prepararmos. Neste momento, apoiamos o projeto do presidente Chávez porque, ainda que não seja o governo que sonhamos, é o que mais se assemelha ao que sempre nós sonhamos”, declara o coordenador editorial Yaarabid Gomez, da rádio Ali Primera (98.3 FM).

O fato é que, na prática, as comunidades adquiriram voz própria e liberdade para comunicar não apenas os ideais socialistas do bolivarianismo, mas também o que é de interesse coletivo do bairro. A rádio tornou-se um meio alternativo que na sua essência socialista transcende o simples “informar”, ela surge como uma necessidade de comunicação entre os moradores, como é a história da Negro Libre Primero, localizada em um antigo prédio de três andares na periferia de Caracas.

“No ano de 2002, em meio ao golpe de Estado e greve do petróleo, o cidadão pobre que vinha a este posto (à frente da rádio) não poderia comprar a gasolina barata ou comprar o gás na bodega da esquina. Todos estes elementos a oligarquia mandou fechar, e as pessoas não sabiam onde poderiam buscar estes produtos. Foi então que começamos a perceber que estávamos sem comunicação”, relembra o também apresentador Carlos Lugo.


Rádio Negro Libre Primero realiza projetos sociais (Crédito: Renan Justi)
Outras iniciativas
Para quem é morador da comunidade La Candelaria, onde é sintonizada a Negro Libre Primero, existe o que eles chamam de processo de desenvolvimento social. Graças à radio, a comunidade dispõe de iniciativas sociais e projetos de capacitação profissional. “Estes cursos (carpintaria, construção e costura) são preparatórios para estabelecermos grandes redes coletivas, onde todos podem compartilhar e ser donos daquilo que produzimos”, declara Lugo.

As novas instalações da rádio mostram que o próximo passo, como já está sendo construído, será a criação de uma padaria e açougue dentro do prédio da rádio, onde as pessoas irão aprender a produzir o que elas precisam consumir e, inclusive, adquirir mantimentos por preços menores, desprendendo-se do consumismo capitalista.

A moradora do bairro, Pátria América Zapata, que participa das aulas de costura, busca no passado a explicação para o processo “revolucionário-socialista” que a Venezuela chavista almeja há tanto tempo. “Estamos aqui hoje, data 9 de outubro, dia importante para todos, morte de Ernesto Che Guevara. E aqui, na rádio, enquanto abrimos estes projetos de formação e capacitação, fazemos honra a Che.” E complementa sobre o ambiente de igualdade: “O bom daqui é que todos sabemos e todos vamos aprender”, afirma Zapata.


Rádio Pérola define programação com a comunidade (Crédito: Maísa Tomaz)
Conteúdo colaborativo
Como decreta o governo ao sancionar a livre atuação dos meios alternativos (Lei Orgânica de Telecomunicação, de 2000), o conteúdo dos programas exibidos nas rádios é decidido de forma participativa entre quaisquer membros engajados da comunidade e produtores, construindo-se um laço de identificação com o material que vai ao ar.

É com base nesta lei que a rádio Perola (92.3 FM), instalada no piso térreo de um prédio residencial, define sua linha editorial. Sua programação é produzida com responsabilidade, centralizada nas questões que envolvem o bem social de quem vive no bairro Caricuao. Um exemplo é o programa “Em Família”, apresentado por Cristel Arrellano, funcionária do Ministério da Educação da Venezuela, que orienta os pais sobre como melhorar a qualidade de vida da população infantil, abordando temas ligados à saúde e educação.

A iniciativa de organizar um programa com estes temas surgiu a partir do alto número de jovens grávidas que despontou na comunidade. “Temos anos e anos lutando e trabalhando por isto, que para nós significa um projeto de vida, um sonho realizado por ajudar muitíssimas pessoas que não tem tantas alternativas”, revela Arellano.


Rádios funcionam na periferia de Caracas e comunidade ajuda a manter emissoras (Crédito: Renan Justi)
Meio alternativo
Um fator decisivo para o nascimento das rádios comunitárias foi a falta de identificação com os meios de comunicação privados, por não se sentirem representados por um conteúdo produzido pelas classes mais abastadas. “Hoje e ontem, os meios de comunicação privados tentam monopolizar as rádios. Surgimos, então, por uma necessidade de sermos escutados, das pessoas poderem dizer o que pensam, afinal, as comunidades também têm o direito de expressar-se sem comercializar o meio”, diz Marcos Flores, colaborador da Perola, sobre a democratização comunicacional do país.

Embora haja apoio incontestável dos meios comunitários às campanhas do presidente Chávez, mantido no poder há 12 anos, não há qualquer recompensa financeira por parte do governo. O sustento da rádio Ali Primera, montada dentro da Universidade Simón Rodriguez, é sacado do bolso de cada produtor, que colaboram mensalmente com 20 bolívares fortes, o equivalente a 8 reais. O coordenador Yaarabid esclarece este procedimento ao ilustrar como eles, moradores do bairro El Valle, conseguiram dinheiro para um novo equipamento. “Aqui sequer fazemos publicidade institucional. Em 2002, o CD player da rádio foi danificado e tivemos que vender nossa moto para comprar um novo”, revela.

Se as recentes eleições legislativas, em setembro, na Venezuela apontaram uma queda de prestígio do partido de Chávez (PSUV) perante os venezuelanos, Yaarabid mantém um discurso fiel e coerente à ética socialista, mas com ressalvas. “Nós acreditamos neste processo revolucionário porque estamos comprometidos com o próprio princípio moral, nossa forma de pensar, independente se Chávez preste algum apoio econômico”, finaliza.

sábado, 25 de dezembro de 2010

CASO ROGER ABDELMASSIH Vai cair a casa do amo?

Por Ana Reis - médica

Acompanho as práticas de Roger Abdelmassih há mais de duas décadas. Não foi preciso entrevistá-lo nem fazer plantão na clínica dele. Bastou acompanhá-lo na mídia, onde vinha desrespeitando o código de ética médica sistematicamente, expondo clientes famosos.

Na extinta revista Manchete, na atualíssima Caras, no eterno programa da Hebe Camargo, em seus trajes de dândi, desfilava propagandeando o seu negócio: fazer bebês. Quem não ficou sabendo dos "trigêmeos de proveta" do Pelé? Lembro-me, entre tantas aparições, de uma "visita" que o programa da Hebe fez à sua clínica e como foram motivo de piada as revistas Playboy na sala de coleta de esperma.

No site dessa que era a "maior clínica da América Latina", atributo repetido até hoje nos telejornais – bem ao gosto da mania guinessiana de maior-do-mundo brasileiro – a história do sucesso de Abdelmassih é contada, atribuindo-o ao "efeito Pelé". Foi através desse precioso garoto-propaganda que ele vendeu a técnica da injeção de espermatozoides dentro dos óvulos – a ICSI, usada para "tratar" problemas de infertilidade masculina. Pelé, pai várias vezes, tinha feito vasectomia.

Estou falando só de homens e espermas porque Roger Abdelmassih é urologista, e não ginecologista.

Denúncia caiu no vazio

As primeiras perguntas que se impõem são: o que fazia esse urologista distribuindo beijos carinhosos – segundo suas próprias palavras, defendendo-se! – em pacientes mulheres? Onde estavam os Conselho Regional de Medicina de São Paulo - Cremesp e o Conselho Federal que não viram a exposição de pacientes? Eles nunca leram as Caras em suas salas de espera? Onde estava a Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia – Febrasgo, que nunca estranhou a defesa de famosas como Luiza Thomé indo ao socorro de um urologista que manipulava seu aparelho reprodutivo?

Mais recentemente, com a espetacularmente divulgada corrida às células-tronco e sua miraculosa capacidade de gerar lucros, Roger Abdelmassih instalou na clínica um laboratório onde se buscava desenvolver óvulos e espermatozoides a partir de dentes de leite. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária teria sido informada? Ou será que, a exemplo de mais de 85% das clínicas de reprodução – aliás, Bancos de Células e Tecidos Germinativos, como passaram a ser denominadas – não pediu licença e nem enviou seus relatórios a essa agência governamental?

Todas as clínicas integram hoje um Sistema Nacional de Produção de Embriões - SIS-Embrio. O seu, como os demais bancos, não recebeu nenhuma punição por isso?

Há cerca de dois anos atrás, convidada por Jurema Werneck e Carmen Lucia Luiz, fiz uma explanação para os componentes do Conselho Nacional de Saúde sobre as minhas preocupações quanto às consequências dessas práticas para as mulheres, postas a fabricar óvulos para a indústria farmobiotecnológica. Apresentei, inclusive, páginas da Caras com fotos da festa dos "5.000 bebês do dr. Roger Abdelmassih", onde estavam os famosos e demais clientes. Presente, um membro do Conselho Federal de Medicina. Se nunca tinha lido, leu naquele dia.

Apesar do apoio das companheiras, a denúncia caiu no vazio.

170 depoimentos sobre idoneidade

Quando finalmente explodiram as denúncias (lembrar que não bastou uma nem duas mulheres para formalizar uma investigação, mas dezenas – e bastarão?) iniciei um abaixo-assinado para ser enviado ao Ministério Público no sentido de tomar providências para responsabilizar o Cremesp por omissão. Depois de mais de 100 assinaturas, a Rede Feminista de Saúde resolveu encampar a iniciativa. A entrada e abertura de protocolo, junto ao Ministério Público, em São Paulo, e ao Cremesp, foi feita pela companheira Rosa de Lurdes. Vivendo em Salvador, não pude acompanhá-la nessa que foi uma solitária entrega.

Não sei de outros pronunciamentos ou providências cabíveis por parte de instâncias de controle social, como a Comissão de Saúde da Mulher - Cismu, do Conselho Nacional de Saúde.

Passada a emoção da notícia da condenação e lendo depois os discursos nos telejornais, fico com a forte impressão de que ele muito provavelmente não cumprirá pena. Não entendo como uma pessoa condenada a 278 anos de cadeia não oferece perigo para a sociedade e aguarda solto o recurso. Para quem, na sociedade, ele não oferece perigo? Para os homens que se omitiram todo esse tempo? Para Gilmar Mendes, que mandou soltá-lo? Para a Febrasgo, o Cremesp? Na TV, foi grande o espaço para os argumentos do advogado de defesa, de que não foram levados em conta depoimentos sobre a idoneidade do estuprador, dados por 170 testemunhas – sobretudo de maridos de pacientes, como fez questão de salientar.

Submetidas a ainda piores tempos

São as vozes masculinas sobrepondo-se às denúncias das mulheres abusadas. E, assombros dos assombros!, a sentença foi proferida – incômodo detalhe a ser suprimido – por uma juíza.

"O homem de famílias", como diz no site da clínica, o "homem dos 5.000 bebês" são falas da apropriação do processo reprodutivo pelo poder médico patriarcal, pano de fundo das técnicas invasivas e mentirosas (85% de fracasso).

Roger Abdelmassih se acha no direito pleno de beijar as pacientes. O "fazer os bebês" passa, parece evidente, pela fantasia – levada grosseiramente à prática – de fazer sexo com essas mulheres. O corpo delas lhe pertence. Como a todos os demais homens, com suas Playboys, seus "supremos" tribunais de fancaria, seus conselhos disso e daquilo, suas CPIs do aborto e seu poder de impedir qualquer mulher de se dizer dona do próprio corpo. Inclusive uma presidenta da República.

Sabemos todas que é nessa apropriação coletiva que se ancora o patriarcado. O corpo das mulheres é a primeira propriedade, garantida através da heteronormatividade. Antes de inventarem o direito à propriedade, os homens inventaram a propriedade dos direitos.

Como alertou a poeta negra, lésbico-feminista Audre Lorde, não se pode destruir a casa do amo com as ferramentas do amo. Nosso desafio é criar outras ferramentas. Urgentemente. O caso Abdelmassih é um termômetro do que vem por aí, com os talibispos fazendo dos nossos corpos o seu território de poder. Ou nos organizamos para resistir – com nossas ferramentas próprias – ou seremos submetidas a ainda piores tempos.

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

O assassinato do futuro


A notícia dada de maneira rápida. Os pequenos flashes de informação (manter-se informadas/os?) e a apresentadora lança a nota: “Menino de 11 anos, acusado de assaltos, é assassinado em Cabedelo (PB)”. Em seguida, comercial e a vida segue normal. Normal?
Crianças, Crianças estão se envolvendo em situações de violência cada vez com mais cedo e com intensidade. A sociedade e os governantes assistem parados, estáticos a todo este quadro que se agrava a olhos vistos. A situação é delicada e triste. Existem conselhos tutelares, conselhos de defesa dos direitos de crianças e adolescentes, mas parece que nada consegue parar esta onda avassaladora de violência que atinge estas crianças e adolescentes carentes.
Há claramente uma guerra de classes. Não podemos negar isto e fugir da realidade. Não se cuida adequadamente destas crianças, há muitas iniciativas ótimas que alguns órgãos tentam colocar em prática, mas parece que esbarram na burocracia, ou na má vontade mesmo de não querer solucionar este problema social. É duro dizer, e sei que dói quando se fala, esta ferida está eternamente aberta, mas parece que se deixa o problema chegar a níveis extremos e não se dá a devida importância de que são VIDAS sendo exterminadas pela violência. São seres humanos, os quais lhes são arrancados o futuro e a dignidade. O caminho tem sido a rua, as delegacias e os necrotérios. Quando deveria ser a escola e parques de diversões. É difícil para qualquer jornalista ler ou escrever uma noticia como esta.
Os governos vão empurrando com a barriga, fingindo que são tomadas soluções, mas o que assistimos de maneira seca e que não dá para engolir de jeito nenhum, são acontecimentos como este e que somos obrigadas/os a ouvir ou ler na mídia. Sabemos que a situação é delicada e que a raiz da questão é profunda, deixou-se crescer e ganhar raízes fortes, fingir que faz algo, para agora tentar soluções paliativas. mas que muito´pouco mudam a realidade.
A notícia de mais mortes no presídio do Roger, em João Pessoa, esta semana e a divulgação do relatório do Conselho de Defesa dos Direitos do Homem e do Cidadão da Paraíba alertando para o caos em que se encontrava a instituição prisional é mais um exemplo de que há uma guerra de classes posta.
A solução pode não ser fácil, não é mesmo. E creio que a mídia deve contribuir também, assim como fez com a matéria que denunciava as condições do presídio do Roger e dos presos que lá se encontravam, como também mostrar a situação grave e triste que passa milhares de crianças e adolescentes abandonados nas ruas de João Pessoa. Além de cobrar das “autoridades competentes” que façam valer os cargos que ocupam. O que não dá é continuar a noticiar fatos desta natureza e não propor soluções. Saber que crianças estão sendo exterminadas por um sistema desigual não pode ser uma informação habitual na mídia.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Abraço Nacional adia Congresso de rádios comunitárias

13 de dezembro de 2010.
R E S O L U Ç Ã O 02/2010

A Direção Nacional Colegiada, em reunião vai internet , diante da burocracia para a liberação da emenda parlamentar da Dep. Luiza Erundina, contemplando a totalidade das passagens aéreas para os 500 delegados e delegadas ao VII Congresso Nacional da Abraço, marcado para os dias 16 e 17 de dezembro de 2010, no Museu Nacional dão Conjunto Cultural da República em Brasília e, diante da negativa de agências de viagens aceitarem promover a emissão das passagens mediante fatura para acerto futuro, resolve:
1 - Adiar o VII Congresso Nacional para os dias 20, 21 e 22 de janeiro de 2011, no mesmo local.
2 – Prorrogar o mandato da atual Direção Executiva até o dia 15 de janeiro de 2011.
Segue anexa a resposta da agência de viagens responsável pela emissão das passagens.

Direção Nacional Colegiada

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

A senhora das palavras - Joan Jett


"Outras pessoas me chamam de rebelde, mas, para mim, estou simplesmente vivendo minha vida e fazendo o que quero fazer. Às vezes as pessoas chamam isso de rebeldia, especialmente no caso de uma mulher. Um homem que sabe o que quer é visto como líder. Se uma mulher sabe o que quer, ela é uma vadia." - JOAN JETT - RUNAWAYS

Mulheres marcam presença no VII Congresso Nacional da ABRAÇO


Brasília vai sediar nesta quinta (16) e sexta –feira (17), o 7º Congresso Nacional da ABRAÇO (Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária).
O debate principal girará em torno das inovações tecnológicas e desenvolvimento local sustentável das rádios comunitárias no Brasil. O congresso começou a ser pensado, em 2007, e foi discutido que era preciso aumentar a participação das mulheres na radiodifusão comunitária. E para garantir que o maior número de mulheres participe do Congresso, foi criada uma política de cotas. Das 500 emissoras que estão sendo esperadas para o Congresso Nacional, 30% no mínimo devem ser dirigidas por mulheres, ou seja, 150 deverão participar do Congresso. Esta deliberação aconteceu por se perceber que a entidade, segundo o seu presidente José Sóter, que deve primar desde sempre pela equidade de gênero, tinha uma presença marcadamente masculina e que isto precisava ser quebrado. Logo no primeiro dia do Congresso, será realizado um encontro histórico entre mulheres dirigentes de rádios comunitárias do Brasil.
A participação das mulheres na luta pela democratização da comunicação, e neste caso, nas rádios comunitárias, é muito marcante. A Rede de Mulheres no Rádio, hoje Rede de Mulheres em Comunicação, que surgiu em 1995, conta com muitas mulheres que estão em rádios comunitárias e que participaram/participam da ABRAÇO, a exemplo de Lise Guimarães, de Pernambuco, entre outras.
A ABRAÇO é uma entidade que existe desde 1996 e agora dá um passo importante para a consolidação da luta das mulheres dentro das rádios comunitárias. Na Paraíba, a presença feminina nas rádios comunitárias começa a mudar, apesar de ainda sermos poucas, principalmente em cargos de decisão, como dirigentes, coordenadoras, etc. Na diretoria executiva da entidade na Paraíba, composta por nove pessoas, quatro mulheres ocupam cargos de coordenação. Para o Congresso da ABRAÇO, a Paraíba irá com uma comitiva de 25 pessoas, sendo 8 mulheres, seguindo o que rege a política de cotas criada para garantir a presença feminina no encontro. Apesar das cotas, percebe-se que os homens continuarão a ser maioria. E não é apenas na Paraíba que se registra esta diferença. Em Santa Catarina, também serão 8 mulheres para 17 homens. Entre os objetivos do I Encontro de Mulheres Dirigentes está a formação de um coletivo nacional de mulheres das rádios comunitárias. Bom indicativo. “A questão de gênero e a participação política das mulheres por meio das rádios comunitárias”, é uma das mesas que consta na programação do Congresso.
Este é o momento fundamental para que as mulheres que fazem parte das ABRAÇOS Regionais e da Nacional se mobilizem, se organizem e marquem presença política neste Congresso, fazendo ecoar nossas vozes neste meio tão importante para difundir, exigir e garantir a implementação de políticas públicas para todas nós e fazer valer o caráter público das rádios e a democracia popular. E, definitivamente, ocupar cada vez mais os espaços de decisão na entidade. Na ocasião, haverá eleição para a nova diretoria da ABRAÇO Nacional. Quem sabe não será uma mulher a ocupar o cargo de coordenadora executiva?

CONFIRA A PROGRAMAÇÃO:

16 DE DEZEMBRO
CREDENCIAMENTO - a partir das 9 h
14 h – aprovação do Regimento Interno e instalação da Mesa Coordenadora e a Comissão Eleitoral
15 h – Mesa sobre produção e distribuição de conteúdos – Agencia Abraço de Comunicação e MPB
16 h – Encontro Nacional dos Coletivos Estaduais de Mulheres dirigentes de Rádios Comunitárias – Cfêmea, Mara Régia, Unifem, SPM-PR, Inês Fortes, Kamayura Saldanha, Rosa Marques
17 h - Colóquios – nas tendas
1 – As radcom e a valorização da cultura local – James Gorguen – Ministério da Cultura, José Sóter – Coordenador Executivo
2 – As relações trabalhistas nas radcom – Nascimento Silva - Fitert, Zilmara – MTE e João Carlos Santin - Coordenação Jurídica e Estudos Sócios Econômicos,
3 – Grade de Programação: prisão ou libertação da informação e do debate para a formação da cidadania – Mara Régia, Luciano Barroso, Josué Lopes - Coordenador de Comunicação e Cultura
4 – Radcom, Software Livre e Inclusão Digital - Sepro
5 – Sustentabilidade nas radcom – Sebrae, Miro Barrios – Economia Solidária, SECOM-PR, Valdeci Borges - Coordenador de Finanças
6 – O papel do parlamento da democratização das comunicações – Dep. Luiza Erundina, Senadora Marinor Brito, Senador Randolf, Senador Walter Pinheiro, Fernando Ferro, Rômulo Gadelha - Coordenador de Relações Institucionais e Internacionais
7 – Conselho Nacional de Comunicação: seu papel para a construção de uma comunicação democrática no brasil - representante da Ottoni Fernandes – SECOM-PR, Octávio Pieranti - EBC, Clementino Lopes – Coordenador Regional Sul
8 - As rádios comunitárias e os movimentos sociais - Fitert, Fenaj, FNDC, AMARC, Intervozes – Coordenador de Relações Institucionais e Internacionais
9 – A indução do Desenvolvimento das Ciências nas ondas das Radcom – Professor Ildeu - MCT
10 – A questão de gênero e participação política das mulheres por meio das rádios comunitárias - UNIFEM
20 h: Solenidade de abertura
Coordenação: Comissão Organizadora Nacional - CON
convidados: parlamentares eleitos, presidente Lula, FNDC, CUT Nacional, Fenaj, Fitert, Fenajufe, MNU, MST, Amarc, Intervozes, Minicom, MCT, MinC, SPM-PR, Secom-PR, MDS, Secretaria Geral - PR

17 DE DEZEMBRO

DE 8 ÀS 12 h - credenciamento
9:00 h - I CONFERENCIA
Digitalização e Inovações tecnológicas para radiodifusão comunitária
Coordenação: Coordenação de Formação e Inovação Tecnológica
Convidados:Takashi, Manhães e MCT
10 h - II CONFERENCIA
Radcom, desenvolvimento sustentável e tecnologias sociais
Coordenação: Coordenador Jurídico e estudos sócio-econômicos
Convidados: FBB, MMA, MDS
11 h - III conferencia:
Balanço dos resultados da I Confecom
Convidados: Dep. Luiza Erundina, Fitert, Fenaj, CFP, Intrevozes, Cut, Abccom
Membros da Comissão Organizadora Nacional da Confecom
12 h - almoço
13 h – IV Conferencia
Plano Nacional de Lutas 2010/2013
Coordenação:
Direção Executiva Nacional
Convidados:
Coordenadores estaduais da abraço
14:30 h – Grupos de Trabalho
16 h - Plenária Final – aprovação dos relatórios dos GTS, aprovação de moções e resoluções.
17 h – apresentação ao vivo do Programa Prosa Rural
18 h – jantar
19 h - eleição e posse da nova Direção Executiva Nacional Conselho Fiscal e Conselho e Ética
21:00 h - Encerramento

DIA 18 DEZEMBRO

9:00 h – Reunião da Direção Nacional Colegiada e do Coletivo Nacional de Mulheres dirigentes de Rádios Comunitárias da Abraço

Propaganda de ateus é suspensa




A campanha polêmica da Atea (Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos) não será veiculada. A ideia de mostrar 4 peças que combatem o preconceito à religião, em defesa ao ateísmo, vazou na última sexta-feira, mas já foi barrada. A propaganda seria exibida nos ônibus de Salvador e Porto Alegre a partir desta segunda.

De acordo com nota publicada no site da Associação, a empresa responsável pela veiculação na capital baiana entrou em contato com a Atea informando que não iria cumprir o contrato assinado com a entidade, temendo ação do Estado e dos empresários de ônibus. A Atea informou que estuda ação legal.

Além disso, de acordo com o site, a Agência de Transportes Públicos em Porto Alegre vetou a campanha local sob argumento de que infringe uma lei municipal que veta temas religiosos na publicidade de ônibus. A ação aconteceria em 10 ônibus em Porto Alegre, financiados por um único doador paulista, e 5 ônibus em Salvador, financiados com recursos da entidade e outros doadores.

Na sexta-feira a repercussão foi grande. Ganhou destaque em vários portais e jornais ao passo que também gerou polêmica. As peças mostram, por exemplo, que religião não define caráter. Em um dos anúncios, Charles Chaplin e Adolf Hitler aparecem lado a lado, sendo que o primeiro deles dizia não acreditar em Deus e o segundo, sim.

A Atea afirma que a campanha "não procura fazer desconversões em massa". Diz que os objetivos são "conseguir um espaço na sociedade que seja proporcional aos números, diminuindo o enorme preconceito que existe contra ateus, e caminhar rumo à igualdade plena entre ateus e teístas, que só existe quando o Estado é verdadeiramente laico - o que está muito, muito longe de acontecer"

História

De acordo com a Atea, o lançamento da campanha ocorreu pouco depois de o Ministério Público Federal ajuizar ação civil pública contra o jornalista José Luiz Datena pedindo retratação de suas afirmações ofensivas contra ateus. Datena é alvo de um inquérito civil aberto pelo Ministéiro Público Estadual e uma investigação criminal na Delegacia de Crimes de Racismo e Discriminação, em São Paulo, requerida pela Atea.

A Associação afirma que as iniciativas de autoridades públicas em defesa dos ateus, embora tenham sido provocadas pela Atea e outros ateus, são inéditas no país e "constituem marcos importantes na luta por direitos". Recentemente, a Atea exerceu direito de resposta em dois grandes jornais do país com relação a um par de artigos de Frei Betto relacionando tortura a ateísmo militante.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Wikileaks - o poder está nu

Esta semana estamos acompanhando através de sites, TVs e jornais, nacionais e internacionais, uma série de reportagens sobre o site Wikileaks, que divulga documentos mantidos em segredo de Estado por governantes de todo o país. O fundador do site, Julian Assange, encontra-se preso na Inglaterra sob acusação de violência sexual e outros crimes. Uma farsa montada para desmoralizar Assange e assim fazer com que ele saia de circulação e caia em descrédito, já que revela documentos ultrasecretos contando como os estados, tidos como exemplos de cidadania e respeito aos direitos humanos, agem de fato. Acusar de crimes sexuais inimigos do Estado é das práticas comuns dos governantes.

Em defesa da liberdade de expressão (sempre!), SENHORA DAS PALAVRAS, traz dois artigos publicados na revista eletrônica NOVAE, sobre o caso Wikileaks, além de um vídeo inédito com entrevista do próprio Julian Assange.

Porque será que a grande mídia não divulga este material?

Uma revolução começou — e será digitalizada

Por Heether Brooke*, do The Guardian

A diplomacia sempre incluiu jantares com as elites dominantes, acertos de bastidores e encontros clandestinos. Agora, na era digital, os relatos de todas estas festas e diálogos aristocráticos pode ser reunido numa enorme base de dados. Uma vez recolhidos em formato digital, é muito fácil compartilhá-los.

Na verdade, é para isso que a base de dados Siprnet, de onde os segredos diplomáticos norte- americanos são vazados, foi criada. A comissão governamental criada nos EUA para avaliar a segurança nacional após o 11 de Setembro fez uma descoberta notável: não era o compartilhamento de informações que ameaçava os EUA, mas o não-compartilhamento. A falta de cooperação entre agências governamentais e a retenção de informações por burocratas desperdiçaram muitas oportunidade para bloquear os ataques contra as Torres Gêmeas. Em resposta, a comissão ordenou uma restruturação dos serviços do governo e da inteligência, para que se adaptassem à própria web. A nova prática era de colaboração e compartilhamento de informações. Mas, ao contrário de milhões de membros do governo e empresas terceirizadas, o público não tinha acesso à Siprnet.

Porém, os dados têm o hábito de se espalhar. Eles escorregam entre a segurança militar e também podem vazar pelo Wikileaks, o meio pelo qual eu obtive as informações. Eles violaram até os prazos de fechamento do Guardian e de outros jornais envolvidos na divulgação da história, quando um cópia clandestina do semanário alemão Der Spiegel acidentalmente chegou às bancas em Basle, na Suíça, domingo passado. Alguém a comprou, entendeu o que ela continha e começou a escanear as páginas, traduzindo-as do alemão para o inglês e postando no Twitter. Parece que os dados digitalizados não respeitam autoridade alguma, esteja ela no Pentágono, no Wikilieaks ou num editor de jornais.

Cada um de nós já viveu, pessoalmente, as enormes mudanças que vêm com a digitalização. Fatos ou informação que considerávamos efêmeros e privados agora são permanetes, públicos e agregáveis. Se o volume dos atuais vazamentos parece grande, pense nos 500 milhões de usuários do Facebook, ou nos milhões de registros mantidos pelo Google. Os governos mantêm nossos dados pessoais em enormes bases. Era caro obter e distribuir informação. Agora, é caro retê-la.

Mas quando os devassa de dados atinge o público, os governantes parecem não se importar muito. Nossa privacidade é disponível. Não surpreende que a reação aos novos vazamentos seja, agora, diferente. O que transformou, num sentido revolucionário, a dinâmica do poder não é a escala das revelações – mas o fato de que indivíduos podem tornar pública uma cópia de documentos do Estado. Em papel, estes vazamentos equivalem, segundo estimativas do Guardian, a 213.969 paginas A4, que teriam, empilhadas, a altura de 43 quilômetros. Algo impossível de vazar com segurança, na era do papel.

Para alguns, a novidade significa uma crise. Para outros, uma oportunidade. A tecnologia está rompendo as barreiras tradicionais de classe, poder, riqueza e geografia – e substituindo-as por um ethos de colaboração e transparência.

Um ex-embaixador dos Estados Unidos na Rússia, James Collins, disse à CNN que a revelação dos registros pelo Wikileaks “impedirá que as coisas seja feitas de forma normal e civilizada”. Muito frequentemente, “normal” e “civilizado” significa, na linguagem diplomática, fazer vistas grossas para injustiças sociais flagrantes, corrupção e abuso de poder. Depois de ler centenas de documentos, constato que muito dos “danos” que eles provocam é revelação embaraçosa e constrangedora de verdades inconvenientes. Em nome da segurança de uma base militar num dado país, nossos líderes aceitam um ditador brutal que oprime seu povo. Isso pode ser conveniente a curto prazo para os políticos, mas as consequências a longo prazo para os cidadãos do planeta podem ser catastróficas.

Os vazamentos não são o problema, apenas o sintoma. Revelam a desconexão entre aquilo que as pessoas desejam e precisam e o que realmente fazem. Quanto maior o segredo, mais prováveis os vazamentos. O caminho para superá-los é assegurar um mecanismos robustos para acesso público a informação relevante.

Graças à internet, esperamos um nível muito maior de conhecimento e participação, em muitos aspectos de nossas vidas. Mas os políticos resistem resolutamente aos novos tempos. Vêem-se como tutores de um público infantil – que não merece nem a verdade, nem o poder real que o conhecimento oferece.

Muito da revolta governamental sobre os vazamentos não tem a ver com o conteúdo do que é revelado, mas com a audácia de quem rompe o que eram fortalezas invioláveis da autoridade. No passado, confiávamos nas autoridades. Se um governante nos dissesse que algo poderia prejudicar a segurança nacional, tomávamos a afirmação como verdade. Agora,os dados crus por trás desta crença estão se tornando públicos. O que percebemos de vazamentos sobre as despesas de parlamentares, ou a cumplicidade de governos com a tortura, é que quando os políticos falam sobre uma ameaça à “segurança nacional”, referem-se frequentemente à defesa de sua própria posição ameaçada.

Estamos num momento crucial, em que alguns visionários, na vanguarda de uma era digital, enfrentam quem tenta, desesperadamente, controlar o que sabemos. O Wikileaks é o front de guerrilha, num movimento global por maior transparência e participação. Projetos como o Ushahidi usam redes sociais para criar mapas onde os cidadãos podem relatar violências e desafiar a versão oficial dos fatos. Há ativistas empenhados em liberar dados oficiais, para que as pessoas possam ver, por exemplo, os orçamentos públicos em detalhe.

Por ironia, o Departamento de Estado dos EUA foi um dos grandes incentivadores da inovação técnica, como meio para levar a democracia a países como o Irã e a China. O presidente Obama exortou regimes repressores a deixar de censurar a internet. No entanto, uma lei que tramita no Congresso permite ao Procurador-Geral em Washington criar uma “lista suja” de websites. É possível acreditar numa democracia forte apenas para assuntos externos?

Os governantes costumavam controlar os cidadãos por meio do fluxo restrito de informações. Agora, está se tornando impossível vigiar o que a sociedade lê, vê e ouve. A tecnologia permite desafiar coletivamente a autoridade. Os poderosos vigiaram por muito tempo as sociedades, para controlá-las. Agora, os cidadãos estão lançando um olhar coletivo sobre o poder.

É uma revolução, e todas as revoluções geram medos e incertezas. Caminhamos para um Novo Iluminismo da Informação? Ou a revanche daqueles quer querem manter controle a qualquer custo nos levará a um novo totalitarismo? O que ocorrer nos próximos cinco anos definirá o futuro da democracia no próximo século. Por isso, seria ótimo que os nossos líderes respondessem aos desafios de hoje com um olhar sobre o futuro.


*Heether Brooke é jornalista, escritora e ativista pelo Direito à Informação. Nascida nos Estados Unidos, vive em Londres e colabora com o The Guardian.

O 1º preso político global da internet e a Intifada eletrônica

Julian Assange é o primeiro geek caçado globalmente: pela superpotência militar, por seus estados satélite e pelas principais polícias do mundo. É um australiano cuja atividade na internet catupultou-o de volta à vida real com outra cidadania, a de uma espécie de palestino sem passaporte ou entrada em nenhum lugar. Ele não é o primeiro a ser caçado pelo poder por suas atividades na rede, mas é o primeiro a sofrê-lo de um jeito tentacular, planetário e inescapável. Enquanto que os blogueiros censurados do Irã seriam recebidos como heróis nos EUA para o inevitável espetáculo de propaganda, Assange teve todos os seus direitos mais elementares suspensos globalmente, de tal forma que tornou-se o sujeito mundialmente inospedável, o primeiro, salvo engano, a experimentar essa condição só por ter feito algo na internet. Acrescenta mais ironia, note-se, o fato de que ele fez o mais simples que se pode fazer na rede: publicar arquivos .txt, palavras, puro texto, telegramas que ele não obteve, lembremos, de forma ilegal.

Assange é o criminoso sem crime. Ao longo dos dias que antecederam sua entrega à polícia britânica, os aparatos estatal-político-militar-jurídico dos EUA e estados satélite batiam cabeças, procurando algo de que Assange pudesse ser acusado. Se os telegramas foram vazados por outrem, se tudo o que faz o Wikileaks é publicar, se está garantido o sigilo da fonte e se os documentos são de evidente interesse público, a única punição passível, por traição, espionagem ou coisa mais leve que fosse, caberia exclusivamente a quem vazou. O Wikileaks só publica. Ele se apropria do que a digitalização torna possível, a reprodutibilidade infinita dos arquivos, e do que a internet torna possível, a circulação global da hospedagem dessas reproduções. Atuando de forma estritamente legal, ele testa o limite da liberdade de expressão da democracia moderna com a publicação de segredos desconfortáveis para o poder. Nesse teste, os EUA (Departamento de Estado, Justiça, Democratas, Republicanos, grande mídia, senso comum) deixaram claro: não se aplica a Primeira Emenda, liberdade de expressão ou coisa que o valha. Uniram-se todos, como em 2003 contra as “armas de destruição em massa” do Iraque. Foi cerco e caça geral a Assange, implacável.

Wikileaks é um relato de inédita hibridez, para o qual ainda não há gênero. Leva algo de todos: épica, ficção científica, policial, novela bizantina, tragédia, farsa e comédia, pelo menos. Quem vem acompanhando a história saberá da pitada de cada uma dessas formas literárias na sua composição. O que me chama a atenção no relato é que lhe falta a característica essencial de um desses gêneros: é um policial sem crime, uma ficção científica sem tecnologia futura, uma novela bizantina sem peregrinação, comédia sem final feliz, tragédia sem herói de estatura trágica, épica sem batalha, farsa sem a mínima graça. Kafka e Orwell, tão diferentes entre si, talvez sejam os dois melhores modelos literários para entender o Wikileaks.

Como em Kafka, o crime de Assange não é uma entidade com existência positiva, para a qual você possa apontar. Assange é um personagem que vem direto d'O Processo, romance no qual K. será sempre culpado por uma razão das mais simples: seu crime é não lembrar-se de qual foi seu crime. Essa é a fórmula genial que encontra Kafka para instalar a culpa de K. como inescapável: o processo se instala contra a memória.

O Advogado-Geral da União do governo Obama, que aceitou não levar à Justiça um núcleo que planejou ilegalmente bombardeios a populações de milhões, levou à morte centenas de milhares, torturou milhares, esse mesmo Advogado-Geral que topou esquecer-se desses singelos crimes e não processá-los, peregrinava pateticamente nos últimos dias em busca de uma lei, um farrapo de artigo em algum lugar que lhe permitisse processar Julian Assange. O melhor que conseguiram foi um apelo ao Ato de Espionagem de 1917, feito em época de guerra global declarada (coisa em que os EUA, evidentemente, não estão) e já detonado várias vezes—mais ilustremente no caso Watergate—pela Suprema Corte.



À semelhança do 1984 de Orwell, o caso Wikileaks gira em torno da vigilância global mas, como notou Umberto Eco num belo texto, ela foi transformada em rua de mão dupla. O Grande Irmão estatal o vigia, mas um geek com boas conexões nas embaixadas também pode vigiar o Grande Irmão. Essa vigilância em mão dupla é ao mesmo tempo uma demonstração do poder da internet e um lembrete amargo de quais são os seus limites. Assange segue preso, com pedido de fiança negado (embora o relato seja que o Juiz se interessou pela quantidade de gente disposta a interceder por ele e vai ouvir apelo) e, salvo segunda ordem, está retido no Reino Unido até o dia 14/12. A acusação que formalmente permitiu a captura é o componente farsesco do caso, numa história que vai de camisinhas furadas em sexo consensual à possíveis contatos das personagens com a CIA.

No campo dos cinco "escolhidos" para repercutir a rede anônima, não resta a menor dúvida: cabeça e tronco acima dos demais está o Guardian, que tem tomado posição, feito jornalismo de verdade, e mantém banco de dados com o texto dos telegramas. Brigando pelo segundo lugar, El país e Spiegel, com o Le Monde seguindo atrás. Acocorado abaixo de todos os demais, rastejante em dignidade e decência, o New York Times, que se acovardou outra vez quando mais era de se esperar jornalismo minimamente íntegro. A área principal da página web do jornal, na noite de 07/12, não incluía uma linha sequer sobre a captura que mobilizou as atenções de ninguém menos que o Departamento de Estado:


Enquanto isso, a entrevista coletiva de Obama acontecia com perguntas sobre o toma-lá-dá-cá das emendas entre Republicanos e Democratas, e silêncio sepulcral sobre o maior escândalo diplomático moderno dos EUA. Nada como a imprensa livre.

A publicação dos telegramas não para, evidentemente, no que é outra originalidade do caso: a não ser que você acredite que a acusação sexual na Suécia foi a razão real pela qual o aparato policial do planeta foi mobilizado para prender Assange, cabe notar que o “crime” que motivou a prisão continuará sendo praticado mesmo com o “criminoso” já capturado. O caso Wikileaks inaugura o crime que continua acontecendo já com o acusado atrás das grades: delito disseminado como entidade anônima e multitudinária na Internet. 100.000 pessoas têm os arquivos do Cablegate, proliferam sites espelho com os telegramas já tornados públicos. E a Intifada está declarada na rede, com convocatórias a ataques contra os sites que boicotaram o Wikileaks.

Atualização: e os EUA estão mesmo tentando com os britânicos e suecos a extradição de Assange para processá-lo por ... espionagem!

Atualização II: No Diário Gauche, há um belo vídeo com entrevista de Assange em Oxford, com legendas e tudo.

Diário Gauche: Por que o mundo precisa do WikiLeaks

Diário Gauche: Por que o mundo precisa do WikiLeaks: "Quem responde é o próprio Julian Assange neste vídeo de 19 minutos. A entrevista é de julho de 2010, e foi realizada em Oxford, na Inglate..."

Solidariedade a Mumia Abu Jamal em São Paulo



Manifestações em solidariedade ao preso político, ativista dos Panteras Negras, Mumia Abu Jamal, preso há 28 anos nos Estados Unidos da América.

Maiores informações, acesse www.anarcopunk.org

Solidariedade a Mumia Abu Jamal em Porto Alegre

Jornalista lança livro sobre travestis e transexuais


O jornalista Aureliano Biancarelli acaba de lançar o livro A Diversidade Revelada, sobre travestis e transexuais. A obra traz relatos do cotidiano de 20 personagens, entrevistas com médicos que fazem cirurgia de “transgenitalização” e advogados que se ocupam do tema.

O livro também aborda dois serviços inéditos criados recentemente para esta população, o Centro de Referência da Diversidade (CRD), do Grupo Pela Vidda, e o Ambulatório de Saúde Integral para Travestis e Transexuais, da Coordenação Estadual DST/Aids da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo.

As fotos são de Osmar Bustos. O livro não está à venda, mas interessados podem entrar em contato com o autor (biancare@uol.com.br), ou acessar o link em que a publicação está disponível na íntegra. http://www.crt.saude.sp.gov.br/resources/crt_aids/pdfs/a_diversidade_revelada.pdf.

O livro em "publicações" do site do CRT-Aids Gov SP, e a partir da próxima semana, também no site do Grupo Pela Vidda.

Biancarelli teve passagens pelo Jornal da Tarde e Folha de S. Paulo. Antes de A Diversidade Revelada, o autor escreveu Cirurgia em Campo Aberto (2001, Ed. Brasiliense) e Assassinato de Mulheres em Pernambuco, (2007, Publisher).

sábado, 4 de dezembro de 2010

FORAS (D)À LEI! - O drama do aborto para as mulheres brasileiras.



Quem é a favor do aborto?


... Tai o erro primordial, intencional, sórdido, vil, baixo, fascista, que marca a discussão sobre o aborto no Brasil. “Fé cega, faca amolada.” O pensamento dogmático não é reflexivo, nem dialógico. É pétreo, monolítico, pontiagudo, difuso, confuso, e até mesmo patético.


Quem ousa pensar, quem ousa expressar o que pensa, já sabe dos açoites da história. É marginal. Ou se reproduz inadvertidamente as grandes lógicas ou se é caçado, ora empalado, outra crucificado, enforcado, recorrentemente desqualificado, esquartejado, emparedado, lapidado, na didática da subjugação, na didática da educação para ser rebanho.


A horda fanática que se mobilizou e mobiliza para prestar um desserviço histórico ao Brasil, não fala, vocifera. Exige que o nosso Estado Laico legisle de acordo com os seus livros-armas, lidos de maneira enviesada, descontextualizada e simplificada, para atender as necessidades de preenchimento das suas frustrações, inquietações existenciais e/ou conveniências políticas, doutrinárias.


Precisam de verdades!


O que defendem os que dizem defender o “certo”, o “bom”, a tal “verdade”? Por que se armam e armam fogueiras para atacar quem, nas suas estreitezas, julgam “errados”, “ruins”, “mentirosos”? Liberdade, o que significa?


Emocionante os tão piedosos defensores da vida! Piedade daquele tipo que se sensibiliza com os mineiros resgatados no Chile, para em seguida esquecerem ou não se importarem com a violência cotidiana que os atinge. Assim como o fazem com o aborto, desmemoriados ou negligentes quando se trata da múltipla violência cotidiana que atinge as mulheres, e perpassa a discussão sobre o tema.


Pensemos nele e nelas (nas mulheres, e nas violências),


Quando as mulheres se descobrem grávidas, como reagem os seus “companheiros”? Quando as mulheres se descobrem grávidas, como reagem as suas famílias? Grávidas, quantas conseguem emprego? Grávidas, quantas se vêem sozinhas, abandonadas, sem perspectivas, rotuladas pela sociedade? A espiral de violência que geralmente conduz ao aborto não é colocada em pauta pelos Drs. da Verdade. Esta verdade não convém.


Fato é que de um modo geral as mulheres são abandonadas pelos homens que as engravidam, quando não são estimuladas por estes para praticarem o aborto. São acossadas ou expulsas de casa pelas famílias, por leituras moralistas ou pela questão material de mais uma “boca” em casa para sustentar... Também não conseguem emprego, o que afeta diretamente o seu sustento e o da criança que está por vir, e ainda carregará um rótulo dado por uma sociedade judaico-cristã, que só fala em perdão, mas não perdoa.


O tema aborto traz em si violências, e não uma violência apenas, principalmente para a camadas menos favorecidas. Numa sociedade misógina, desigual, não se pode tratar da questão que mais atendimentos gera no quesito Saúde da Mulher, no SUS, de maneira tão parcial e tosca. O Estado não deve continuar sendo, no cadafalso social, o carrasco que executa o golpe de misericórdia, como assim o fazia depois do Santo Ofício decidir pela purificação das almas “desviadas”, só que agora praticado na “fogueira” das grades de uma prisão.


Quem é a favor do aborto como hobby ou pílula-do-dia-seguinte? Ninguém. O que se coloca aqui é o necessário e complexo debate acerca da descriminalização do aborto no Brasil, que desde 1940 torna também vítimas, em criminosas.


Legislar pura e simplesmente nunca resolveu nada na terra de Pindorama!... Fosse assim a classe política brasileira não seria eminentemente corrupta: é contra a Lei! Fosse assim não haveria abuso sexual contra a criança, sobretudo por religiosos: é contra a Lei (... e Pecado!). Fosse assim as mulheres não seriam espancadas pelos homens: agora também é Lei!...


É assim que criminalizar o aborto não resolve, só empurra o problema para as macas das clínicas clandestinas. E é lá que deixaremos morrer a questão


Professora Daiane Oliveira
www.diariosdeumaeducadora.blogspot.com

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Desdobramentos da CONFECOM serão debatidos em evento na capital

Por Dalmo Oliveira

Depois de quase um ano da realização da primeira e histórica Conferência Nacional de Comunicação (CONFECOM), organizações não-governamentais da sociedade civil paraibana realizam em João Pessoa o “Seminário Democratização e Políticas Públicas de Comunicação”, que ocorrer neste sábado, 04, a partir das 9 horas, no auditório do (Centro de Referência Estadual de Saúde do Trabalhador (CEREST), localizado na avenida Jesus de Nazaré, S/nº, em Jaguaribe, anexo ao CAME.

No primeiro momento ocorrerá a mesa de abertura e temática, coordenada por Camila Galdino. Em seguida, Hildevânia Macedo, da ONG Amazona fará uma fala sobre a comunicação comunitária. Depois um representante da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária na Paraíba (ABRAÇO-PB) fará uma fala sobre políticas públicas de comunicação.

Está previsto ainda para a primeira mesa do evento falas de representante do COMJUNTO, sobre “Democratização dos meios de comunicação”, e do Conselho Regional de Psicologia, abordando o Controle Social dos veículos de comunicação com foco na Psicologia. Depois acontecem os debates a partir das exposições.

Em seguida, o evento terá uma segunda mesa-temática, que vai fazer o resgate sobre o processo da CONFECOM, conduzida pelo ativista Dalmo Oliveira (ABRAÇO-PB/FOPPIR). “A ideia é fazermos um panorama do que foi a CONFECOM, das estapas preparatórias na Paraíba, da participação dos delegados na etapa nacional e dos encaminhamentos que precisamos priorizar”, diz Oliveira. As coordenadoras de Comunicação e de Gênero da ABRAÇO-PB, Fabiana Veloso e Mabel Dias, respectivamente, tambem participarão da atividade, enfocando a atuação das mulheres na rádios comunitárias da Paraíba. Fabiana Veloso é presidente da rádio comunitária Zumbi dos Palmares, localizada no bairro Ernesto Geisel.

O período da tarde será dedicado à discussões em grupos (Rodas de diálogo) para levantar os desafios e perspectivas da implementação das deliberações da CONFECOM também na Paraíba. Mais informações pelo correio eletrônico:seminariodecomunicao@gmail.com