segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Movimento faz ato contra Globo e aciona MPF no caso BBB

Por Bia Barbosa - Observatório do Direito à Comunicação

As mobilizações da sociedade civil organizada se intensificaram esta semana no sentido de cobrar uma responsabilização da Rede Globo pela forma como tratou a suspeita de estupro ocorrida no programa Big Brother Brasil. Na última quinta-feira, a Rede Mulher e Mídia e dezenas de outras organizações signatárias protocolaram uma representação junto ao Ministério Público Federal pedindo novas investigações sobre o caso. O documento, direcionado à Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão, solicita que o MPF também faça uma análise de outros aspectos ainda não considerado peloa Procuradoria.

As organizações entendem que, além do aspecto da estigmação das mulheres, que já está sendo apurado pelo MPF, é preciso investigar a responsabilidade da emissora pela ocultação de um fato que pode constituir crime; por prejudicar as investigações da polícia; por ocultar da vítima todas as informações sobre o que tinha acontecido quando ela estava desacordada; e por enviar ao país uma mensagem de permissividade diante da suspeita de estupro de uma pessoa vulnerável.

Na representação, as entidades signatárias relacionam uma série de ações da emissora e da direção do BBB que teriam resultado nesses questionamentos. Entre elas, a edição da cena feita no programa de domingo e as declarações do direito geral Boninho e do apresentador Pedro Bial, que transformou uma suspeita de violência sexual em "caso de amor". "Tal postura da emissora não apenas viola a dignidade da participante como banaliza o tratamento de uma questão séria como a violência sexual, agredindo e ofendendo todas as mulheres", diz um trecho da representação.

O documento também destaca que, pelo áudio da conversa da participante Monique com a produção do programa, vazado na internet no dia 16, fica claro que ela, até aquele momento, não tinha assistido às cenas da madrugada do dia 15. E lembra que, somente no dia 17 de janeiro - portanto, mais de 48 horas depois do ocorrido - os envolvidos foram ouvidos pela polícia e possíveis provas do crime foram recolhidas. A emissora, assim, teria violado o direito da participante saber o que tinha se passado com ela enquanto estava desacordada e prejudicado as investigações da polícia.

As organizações do movimento feminista solicitaram ainda um direito de resposta coletivo em nome de todas as mulheres que se sentiram ofendidas, agredidas e que tiveram seus direitos violados pelo comportamento da Rede Globo. A Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão em São Paulo, que já solicitou explicações à emissora, agendará em breve uma reunião com os signatários da representação.

Ato na porta da Globo em São Paulo

Na sexta-feira, o mobilização da sociedade civil foi em frente à sede da emissora em São Paulo. Dezenas de feministas e ativistas pelo direito à comunicação protestaram contra a postura da Globo, além de distribuírem para a população um manifesto pedindo a responsabilização da emissora pelo ocorrido. O protesto também foi contra os patrocinadores do programa - OMO, Niely, Devassa, Guaraná Antarctica, Fiat e energético Fusion.

"Estamos aqui para dizer que não é mais possível aceitar a banalização da violência contra as mulheres, principalmente quando isso ocorre num programa de televisão, de uma emissora que é concessionária pública", disse Terezinha Vicente Ferreira, da Ciranda Internacional da Comunicação Compartilhada. "Isso ofende a todas as mulheres e tem um impacto enorme na formação dos valores na nossa sociedade", acrescentou.

Para as organizações, o próprio formato do BBB se alimenta da exploração dos desejos e conflitos provocados entre os participantes, buscando explorar situações limite para conquistar mais audiência. "É mais um desserviço que é prestado ao país por esta emissora, que trata seus telespectadores como "hommers simpson" e cotidianamente atua no sentido contrário da democracia brasileira, ao criminalizar os movimento sociais, fazer campanhas contra os quilombolas e chegar ao cúmulo de negar a existência do racismo no Brasil", criticou o jornalista Pedro Pomar.

Marco Ribeiro, da Federação dos Radialistas (Fitert), lembrou que, semanalmente, um quadro do programa Zorra Total, da mesma emissora, reforça a violência sexual contra as mulheres. "Todos os sábados a Globo faz piada com uma personagem que é vítima de assédio sexual no metrô, e diz ainda pra sociedade que ela deve se aproveitar desse assédio. É um absurdo", afirmou.

Na manifestação, foi reforçada a necessidade do Ministério das Comunicações tomar providências em relação ao ocorrido, e do país debater imediatamente um novo marco regulatório das comunicações, com mecanismos que contemplem órgãos reguladores democráticos capazes de atuar rapidamente em situações como esta.

"O Ministério das Comunicações declarou que está analisando se a Globo, neste caso, não veiculou imagens contrárias "à moral familiar e aos bons costumes", violando um dos aspectos da legislação do setor. No entanto, se trata de uma questão muito mais grave. Estamos falando da violação de direitos fundamentais, o que mostra que o país precisa de um marco regulatório que dê conta de enfrentar abusos cometidos em nome da liberdade de expressão", analisou João Brant, do Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social.

Renata Mielli, do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, lembrou que a Globo, através da Abert (Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão) é uma das maiores oponentes da construção de um novo marco regulatório das comunicações no país, e que historicamente distorce o conceito de regulação para passar para a população a idéia de que o Estado está tentando censurar a mídia.

"Neste momento, com este mesmo argumento, a Abert defende no Supremo Tribunal Federal o fim da classificação indicativa, que é um dos poucos mecanismos que existem para proteger os direitos das crianças e adolescentes de conteúdos impróprios para seus desenvolvimento. Enquanto isso, a Globo se aproveita do espaço de uma concessão pública para violar uma série de direitos humanos", afirmou Renata.

O tamanho da reação do público neste episódio, no entanto, mostra, na avaliação do movimento, que alguma coisa está mudando. "A TV Globo ainda acredita no seu poder inabalável. Mas, os tempos são outros. O caso do estupro no BBB é o tema mais comentado na Internet, é pauta diária no noticiário de todas as TV e rádios do país e teve que ser pautado até no Jornal Nacional. O que era para ser mais uma cena de sexo picante, mais um escândalo de audiência, tornou-se um debate nacional sobre a falta de limite ético na TV. Há muito tempo a TV Globo não era pressionada pela opinião publica com a veemência de agora. Precisamos aproveitar este momento para avançar na luta pela regulação da mídia", concluiu Jacira Melo, do Instituto Patrícia Galvão.

A manifestação foi convocada pela Frente Paulista pelo Direito à Comunicação e Liberdade de Expressão (Frentex), a Rede Mulher e Mídia e o Fórum Nacional pela Democratização na Comunicação (FNDC), e contou com a presença de diversas organizações, entre elas a Marcha Mundial das Mulheres, a Liga Brasileira de Lésbicas, o Sindicato dos Bancários de São Paulo e a Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária de São Paulo.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Movimento feminista pede direito de resposta e que Ministério Público Federal investigue responsabilidade da Globo no caso BBB

Organizações de todo o país entendem que a emissora pode ser responsabilizada pela ocultação de fato que pode constituir crime; por prejudicar as investigações da polícia; ocultar da vítima todas as informações sobre o que tinha acontecido quando ela estava desacordada e por enviar ao país uma mensagem de permissividade diante da suspeita de estupro de uma pessoa vulnerável.

A Rede Mulher e Mídia e dezenas de outras organizações signatárias protocolaram, na manhã desta quinta-feira (19), uma representação ao Ministério Público Federal pedindo a investigação da responsabilidade da Rede Globo no caso do suposto estupro que aconteceu no programa Big Brother Brasil na madrugada do dia 15 de janeiro. O documento, direcionado à Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão, solicita que o MPF adende ao procedimento já instalado pelo órgão sobre a Globo a análise de outros aspectos ainda não considerados pela Procuradoria.

As organizações entendem que, além do aspecto da estigmação das mulheres, que já está sendo apurado pelo MPF, é preciso investigar a responsabilidade da emissora pela ocultação de um fato que pode constituir crime; por prejudicar as investigações da polícia; por ocultar da vítima todas as informações sobre o que tinha acontecido quando ela estava desacordada e por enviar ao país uma mensagem de permissividade diante da suspeita de estupro de uma pessoa vulnerável.

Na representação, as entidades signatárias relacionam uma série de ações da emissora e da direção do BBB que teriam resultado nesses questionamentos. Entre elas, a edição da cena feita no programa de domingo e as declarações do direito geral Boninho e do apresentador Pedro Bial, que transformou uma suspeita de violência sexual em "caso de amor".

"Tal postura da emissora não apenas viola a dignidade da participante como banaliza o tratamento de uma questão séria como a violência sexual, agredindo e ofendendo todas as mulheres", diz um trecho da representação.

O documento também destaca que, pelo áudio da conversa da participante Monique com alguém da produção do programa, vazado na internet no dia 16, fica claro que ela, até aquele momento, não tinha assistido às cenas da madrugada do dia 15. E lembra que, somente no dia 17 de janeiro - portanto, mais de 48 horas depois do ocorrido - os envolvidos foram ouvidos pela polícia e possíveis provas do crime foram recolhidas. A emissora, assim, teria violado o direito da participante saber o que tinha se passado com ela enquanto estava desacordada e prejudicado as investigações da polícia.

Por fim, as organizações do movimento feminista solicitam um direito de resposta coletivo em nome de todas as mulheres que se sentiram ofendidas, agredidas e que tiveram seus direitos violados por este comportamento da Rede Globo.

Além da Rede Mulher e Mídia, estão entre as signatárias da representação a Marcha Mundial das Mulheres, Articulação de Mulheres Brasileiras, Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos, Articulação de ONGs de Mulheres Negras Brasileiras, Liga Brasileira de Lésbicas, Blogueiras Feministas e Campanha pela Ética na TV, entre diversas outras organizações de mulheres de atuação estadual e local e entidades do movimento pela democratização da comunicação.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Vulva la Vida - Vida lá vou eu!



Por Mabel Dias

Falta menos de uma semana para começar a segunda edição do Festival de Contra Cultura Feminista, Vulva La Vida, que vai revolucionar a capital baiana, Salvador.

De 24 a 29 de janeiro, mulheres de diversas partes do planeta estarão juntas participando de shows, debates, rodas de diálogo, oficinas e tantas outras atividades. O Vulva La Vida é um festival totalmente autônomo, independente, faça você mesma, como foi dito desde a convocatória que deu início a ele em 2011, e este tem sido o seu grande diferencial. Desta forma, as organizadoras do Vulva mostram que não é preciso ficar esperando por projetos de governo, empresas ou de Ongs para poder produzir algo, seja lá o que for. E o Vulva La Vida, sem maiores pretensões, está conseguindo aos poucos seus objetivos: reunir mulheres, garotas, meninas para poder discutir sobre feminismo, política e contra cultura, mostrando que é possível produzirmos algo quando queremos e de forma autogestionada.

Da primeira edição do festival, surgiram muitas ideias, shows e até um documentário, que recebeu o título de ‘Vulva La Vida – Vida lá Vou eu’ (título que dá nome a este texto), muito bem produzido, com uma linda capa, desenhada pela anarcopunk Marina Chen, e com belos depoimentos das mulheres que fazem parte do Coletivo Vulva La Vida – formado a partir do primeiro festival, e tem servido de ótima divulgação para que este ano o número de participantes cresça avassaladoramente. Não é à toa que a maioria das oficinas, entre elas, ‘O Cabelo é feminista’, ‘A verdade crua do corpo nu’, e ‘Oficina de escrita feminista’ esgotaram suas inscrições em poucos dias depois de anunciada a programação.

O Vulva La Vida é uma ótima surpresa para aquelas mulheres que estavam em busca de algo que envolvesse temas como estes que estão sendo discutidos no festival, e principalmente, pudessem ter a liberdade de se expressar como quisessem. Autonomia é essencial! Sem falar nos shows e performances que acontecerão durante o festival, feito por mulheres, onde podemos ficar a vontade, entre nós. E não é apenas porque mulheres estão fazendo, mas sim porque existe na essência do Vulva La Vida a horizontalidade, a solidariedade, o feminismo, e as quebras das relações de consumo e da estética. Outros importantes diferenciais.

Participei da primeira edição do festival, que foi realizada em janeiro do ano passado, e agora me preparo para o segundo. Desta vez, vou realizar uma roda de diálogo sobre as mulheres anarquistas e as feministas autônomas. Além disto, vou poder (re) encontrar e conhecer amigas feministas de longa data; algumas que só me comunico via internet. Tenho certeza que este Vulva La Vida será mágica!

De fato, havia uma carência de ações assim no Brasil, e em especial no nordeste. Me lembro que quando foi lançada a convocatória para a realização da primeira edição do Vulva La Vida havia o desejo (e acredito que ainda há) de que esta proposta se disseminasse por outras partes do país e do mundo. Porque não?! Se o Vulva La Vida já chegou a outros países, nada mais esperado que esta idéia se realize por todos os cantos do globo.

É como diz o Coletivo Vulva La Vida: “mude o mundo, comece por você!” E a partir deste festival, nós mulheres vamos começar a mudar o mundo. E a nós mesmas!
Para saber mais sobre o Festival Feminista Vulva La Vida, acesse o blog: http://festivalvulvalavida.wordpress.com/programacao-2012/

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

O que é isso, Presidenta?

por Maria José Rosado, das Católicas pelo Direito de Decidir


É costume dizer que no fim do ano não se deve comer peru ou qualquer outra ave que “cisque para trás”, pois significaria arriscar-se a viver todo o novo ano andando de marcha a ré.

Neste final de 2011, enquanto no Uruguai, seguindo o que aconteceu no México e na Colômbia, o Senado aprova a descriminalização do aborto, no Brasil vivemos o retrocesso.

Nesses países, como também na Argentina, amplas discussões na sociedade apontam na direção de mudanças legais que efetivem o respeito aos direitos humanos das mulheres. Em nosso país, uma Medida Provisória – instrumento herdado do autoritarismo da ditadura militar – decretada em momento oportuno para evitar o debate e a crítica, quer tornar compulsória a maternidade para as mulheres brasileiras.

Nenhum artifício de retórica poderá convencer de que a Medida não diz o que efetivamente diz: Todas as gestantes brasileiras estarão sob a vigilância do Estado e das forças mais reacionárias da sociedade para impedir que a maternidade se realize em nosso país de forma digna do ser humano: como resultado de escolha e decisão pessoal.

A MP assinada pela Presidenta implanta no Brasil a figura da maternidade constrangida. A criação de um cadastro nacional de gestantes havia já sido proposto por um ex-deputado que declarou alto e bom som seu objetivo: combater o aborto. Ora, o Brasil é signatário de documentos internacionais em que se comprometeu a respeitar os direitos das mulheres, especialmente em relação à sua capacidade reprodutiva.

O que leva então o Governo, na figura de sua mais alta representante, a desrespeitar suas próprias decisões políticas? Estaremos diante de uma teocracia disfarçada? Foram públicas e explícitas as pressões de setores religiosos conservadores, contrários à vida das mulheres na última campanha eleitoral. Será então esse cadastro nacional parte do cumprimento de compromissos assumidos naquele momento com tais setores?

Se assim é, repetimos a pergunta: O que é isso, Presidenta? Nossa Constituição, fruto de debate democrático, estabelece respeito às religiões, mas impede o Estado de guiar-se por princípios que impeçam a realização das liberdades individuais, inclusive a de não professar qualquer crença. Não se pode impor doutrinas e valores particulares de grupos religiosos a toda a sociedade. É vergonhoso que, na América Latina, seja o Brasil o país do retrocesso em relação à vida das mulheres, aos seus direitos e à possibilidade da realização livre e desejada da maternidade.

Maria José Rosado é presidenta ONG Católicas pelo Direito de Decidir