quarta-feira, 27 de junho de 2012

Feministas lançam carta de repúdio a cobertura da imprensa nos casos de violência contra a mulher


CARTA ABERTA À IMPRENSA


João Pessoa, 27 de junho de 2012

Prezados/as,

Vimos, através desta carta, manifestar nosso repúdio à maneira que a imprensa tem noticiado os casos de violência contra a mulher no estado da Paraíba, em particular, sobre as imagens utilizadas para ilustrar as matérias.

Não podemos aceitar a maneira que as mulheres estão sendo expostas pela mídia, o que acreditamos reforçar ainda mais esta violência a que somos submetidas no dia a dia.  Entendemos que tais imagens, com corpos mutilados, sem roupas, com tarja nos olhos, entre outras, reforçam a humilhação das vítimas, no que diz respeito aos crimes de caráter machista ou de violência de gênero, e estimulam ou ao menos recompensam aqueles que os cometeram. A humilhação da vítima, seja para lavar a honra, seja para obter prazer (no caso dos estupros) é sim, e não podemos calar quanto a isso, um dos motivos que levam seus algozes a cometê-los.

A imprensa também colabora com a ideia de que a mulher precisa ser "protegida", fazendo com que a sociedade insista na falsa ideia da fragilidade inerente ao nosso gênero.

Precisamos sim, ser protegidas, mas não por homens e pelo comportamento "correto", que em muitos textos é reforçado como uma espécie de redutor da violência contra as mulheres, e sim por leis, igualdade e justiça. Também pelos veículos de imprensa, que têm que divulgar, sim, a violência contra a mulher, que vem alcançando índices alarmantes nos últimos anos.

Frisamos: só em 2012, 73 mulheres foram mortas na Paraíba, segundo dados oficiais divulgados pela Secretaria de Segurança Pública do Estado.

Mas, lembrando, que a mídia é formadora de opinião, identidades e valores, e, portanto, deve prezar pela ética,  respeito à dignidade humana, e às leis que regem este país, fazendo valer a sua responsabilidade social.  
Insistimos que não é preciso recorrer à comunicação do grotesco para informar qualquer fato. Além das imagens, a imprensa da Paraíba tem produzido textos que reforçam a discriminação contra a população pobre, principalmente, quando noticiam mortes que supostamente podem estar relacionadas ao tráfico de drogas, ligando a morte das mulheres ao tráfico e, subjetivamente, afirmando que “ela deveria morrer, pois significava um problema para a sociedade”. A apuração dos fatos, ouvir TODOS os lados envolvidos nos acontecimentos é lição básica que aprendemos na universidade e que não podemos esquecer.

No dia em que a professora universitária, Briggída Lourenço, foi assassinada, alguns veículos de comunicação da Paraíba veicularam imagens dela morta, deitada de costas no chão de seu apartamento e de Elizabeth de Lima dos Santos, que foi assassinada em Mamanguape. Tais imagens violam a privacidade e a integridade das vítimas e em nada contribuem para a denúncia da violência contra a mulher! Reforçamos: ÉTICA DEVE FAZER PARTE DO FAZER JORNALÍSTICO! A profissão tem um Código de Ética que deve ser observado e colocado em prática!

O uso destas imagens viola o artigo 5º, parágrafo X, da Constituição Federal que diz: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”; e ainda, no mesmo artigo, parágrafo V: “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além de indenização por dano material, moral ou à imagem”. Só para citar uma das diversas legislações brasileiras que preveem responsabilidades aos órgãos que violarem a imagem da pessoa.

Entendemos que qualquer continuidade nessa linha de jornalismo, que consideramos sensacionalista e ineficaz, além de ferir os nossos esforços na mudança e conscientização da população acerca dos crimes de gênero, como uma atitude a ser denunciada e combatida.



ASSINAM:


Marcha das Vadias – PB

Cunhã – Coletivo Feminista/PB

Bamidelê – Organização de Mulheres Negras na Paraíba

Coletivo Feminista Teimosia/PB

Ilê Mulher – Porto Alegre/RS

Rede de Mulheres em Comunicação

Grupo de Mulheres Negras Nzinga Mbandi/SP
Associação de Mulheres Flor de Maio
Grupo de Mulheres Negras Saltenses
Associação de Mulheres Negras Acotirene
Associação de Mulheres de Araras/SP
Movimento Pela Saúde dos Povos/PHM Brasil
Rede de Mulheres em Articulação na Paraíba
Sandra Vasconcelos – jornalista
Frente Feminista do Levante
Assembleia Nacional de Estudantes - Livre (ANEL)
Letícia Fernandes Resck – atriz e feminista independente
 Centro de Ação Cultural - CENTRAC


Observatório da Mulher
 Associação das Trabalhadoras Domésticas de Campina Grande – PB
Coletivo Feminino Plural
ELAS POR ELAS - VOZES E AÇÕES DAS MULHERES/SP

- MCTP - MOVIMENTO NACIONAL CONTRA O TRÁFICO DE PESSOAS/SP
Fórum Nacional de Mulheres Negras

CEN - Coletivo de Entidades Negras

Sandra Muñoz – feminista
Eunice Gutman - Via TV Mulher
Sulamita Esteliam, jornalista e escritora 
blogue A Tal Mineira - Recife-PE

O Geledés – Instituto da Mulher Negra

 Articulação de ONGs de Mulheres Negras Brasileiras
Jeanice Dias Ramos, jornalista, Porto Alegre/ RS


Tatiane Scherrer - Orçamentista Grafica – Limeira/SP
Terezinha Vicente - Ciranda Internacional da Comunicação Compartilhada
Associação Cultural e Recreativa ANO AZUL /PB
 Bloco do Universo feminino AS ANJINHAS /PB






 




quinta-feira, 21 de junho de 2012

Os homens que não amavam as mulheres e a Riot Grrrl Lisbeth Salander


 Por Mabel Dias

                                                Noomi Rapace

No começo deste ano, chegou as telas brasileiras o segundo filme da trilogia Millenium, “Os Homens Que Não Amavam As Mulheres”, em sua versão americana, dirigida por David Fincher.

A primeira versão da trilogia, escrita pelo jornalista Stieg Larson, um workaholic nato, foi lançada em 2009, porém, não traz o mesmo vigor da americana que já na abertura provoca um forte impacto no espectador. Imagens cibernéticas embaladas pelo som da banda Led Zeppelin nos fazem entrar, fascinantes, na história do jornalista Mikael Bloomkvist e da hacker e riot grrrl (porque não?) Lisbeth Salander, que em um determinado momento se juntam para investigar o desaparecimento da sobrinha-neta de um empresário sueco. Não haveria melhor pessoa para investigar o sumiço de Harriet Vanger do que Lisbeth. Além de uma ótima investigadora, Lisbeth Salander sentia na pele a misoginia e a violência que esta causava às mulheres. Em pouco tempo que está na investigação, ela já descobre o porquê o assassino cometia os crimes: ódio às mulheres.

Ao lado de Bloomkvist, ela vai desvendando, não apenas o sumiço de Harriet, como também começa a descobrir uma série de assassinatos de jovens mulheres na época em que os nazistas estavam no poder. E na Suécia de 1940 os nazistas tocavam o terror, o que não era diferente em outros países.
Apesar de não ser tão dinâmico quanto o americano, a versão sueca dos “Homens Que Não Amavam As Mulheres”, dirigida pelo dinamarquês Niels Arden Oplev, também traz uma boa interpretação da personagem Lisbeth, incorporada pela atriz Noomi Rapace. Na americana, é a atriz Rooney Mara, que dá vida a riot grrrl e até ganhou o Oscar de melhor atriz pela sua Lisbeth Salander.

Sem dúvida, as cenas mais chocantes de ambos os filmes, são a do estupro que Lisbeth sofre por parte de seu tutor. É nojento, repugnante! No filme mais recente, além do estupro, ela é obrigada a fazer sexo oral em seu tutor. Ao invés de denunciar ao Estado a violência que sofreu, Lisbeth pratica uma ação direta impressionante. Depois de torturar seu agressor, ela tatua no peito dele a frase “Sou um porco estuprador”.  Seria um recado indireto para dizer que não acredita no Estado?

A trilogia Millenium que deveria ter sido uma decalogia não fosse a morte prematura de seu autor, Stieg Larson, é muito bem escrita e elaborada. As duas versões cinematográficas trazem um belo roteiro e uma impecável produção. A versão americana traz um novo final onde o assassino das cinco mulheres judias (diga-se de passagem) é o irmão de Harriet, Martin Vanger, sobrinho neto de Henrik Vanger, o empresário que contrata o jornalista Mikael Bloomkvist para encontrar sua sobrinha desaparecida há 40 anos. E Harriet não está morta, apenas assumiu uma outra identidade para fugir da violência que era submetida, primeiro pelo seu pai, e depois da morte dele, pelo seu irmão, Martin.

Lisbeth Salander dá o toque especial aos dois filmes. Pelo seu visual dark/punk quanto por sua inteligência e anti sociabilidade. Ela não sorri e não quer fazer amigos. Mas se pudermos conviver mais de perto com Lisbeth, percebe-se que ela é fascinante e encantadora. Stieg Larson ao criá-la pode desconstruir o estereótipo do visual punk, apesar de dar-lhe uma personalidade agressiva. O autor do livro Millenium, que deu origem aos dois filmes, dá dicas do porque do comportamento anti social da hacker, e tudo parece ter origem na sua adolescência.  Depois de estabelecer um vínculo maior com seu parceiro de investigação (e em seguida um vinculo amoroso), Lisbeth abre o jogo e conta que vive sob a tutela do Estado porque aos 12 anos tentou matar o pai, queimando-o vivo. Mas ela não revela o motivo. Ou não haveria?
                                               Rooney Mara

Só sei que vale muito a pena assistir a nova versão de “Millenium – Os Homens Que Não Amavam as Mulheres”, e assim como a sua edição sueca. Melhor ainda, é conseguir o livro e devorá-lo, pois com certeza muitas outras histórias serão desvendadas. Não só a da riot grrl Lisbeth Salander.

terça-feira, 19 de junho de 2012

Direitos das mulheres, da juventude, de grupos LGBT e Trans ameaçados na Rio+20!

Desde o dia 13 de Junho negociadores oficiais dos países-membros e autoridades observadoras da ONU têm se reunido sistematicamente ao longo do dia (e da noite) no centro de convenções Riocentro, no Rio de Janeiro (RJ). O objetivo destas reuniões é chegar num consenso sobre o documento final da 2ª Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, popularmente conhecida como Rio+20. A alcunha vem do fato de que a primeira conferência, realizada também no Rio, foi realizada em 1992, há 20 anos atrás.

A Agenda21, estabelecida nesse primeiro momento, trazia uma série de avanços importantes em relação aos direitos humanos, direitos das mulheres, da juventude, e direitos sexuais e reprodutivos. Esta pequena vitória foi fruto de fortes articulações entre lobistas, ativistas e negociadores ligados a movimentos de mulheres e movimentos feministas durante tal processo.  Na Rio+20, que deve se encerrar nesta sexta-feira, porém, a história tem sido outra. O bloco de países G77, apoiado pelo Vaticano, tem ameaçado seriamente o futuro dos direitos sexuais e reprodutivos nas discussões sobre o texto do documento final da Rio+20.

Mas como? O documento não é só um pedaço de papel?
Não. O “pedaço de papel” que é esse documento final é uma espécie de orientação geral dos países-membros da ONU (a grande maioria no mundo) para diversos tipos de política. A ONU não é um governo de todos os governos e não está acima de nenhum deles. É como se fosse um grêmio de todos os governos, um espaço diplomático onde chega-se a consensos, acordos e orientações comuns. Os governos, portanto, são a ONU. São eles que fazem a ONU. Esse documento indica, portanto, a linha política que será reforçada. Governos se comprometem com ele e ele pode ser cobrado. Existe portanto uma importância política neste processo.

Mas o que exatamente está acontecendo com os direitos das mulheres e da juventude na Rio+20?
Na ONU, as cláusulas e resoluções são definidas por consenso primordialmente nas negociações, realizadas por negociadores oficiais dos governos. Um texto final é encaminhado aos chefes de Estado (como a Dilma) para que estes então aprovem e/ou revoguem trechos, se preciso votando. Há muita articulação, porém, por trás disso, para que eles cheguem lá na hora e sustentem a linha que os negociadores vinham seguindo. Em geral, os pontos que são consensuais nas negociações prévias são apenas aprovados, enquanto pontos destacados pelos comitês de negociação como não-consensuais são rediscutidos e votados. Pois é isto que está, neste exato momento, acontecendo.

O texto que está até então aprovado, contestado pelo Vaticano e G77 diz mais ou menos o seguinte sobre “Saúde e População”:

“Reivindicamos a complete e efetiva implementação da Plataforma de Ação de Pequim, do Programa de Ação da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento e as resoluções de suas conferências de revisão, incluindo os comprometimentos que buscam a saúde sexual e reprodutiva e a promoção e proteção de todos os direitos humanos nestes contextos. Enfatizamos a necessidade de que se providencie acesso universal à saúde reprodutiva, incluindo planejamento familiar e saúde sexual, assim como a integração da saúde reprodutiva em estratégias e programas nacionais.

Nos comprometemos a reduzir a mortalidade maternal e infantil, e melhorar a saúde das mulheres, homens, jovens e crianças. Reafirmamos nosso compromisso com a igualdade de gênero e a proteção dos direitos de mulheres, homens e jovens a terem controle e decidirem livremente e responsavelmente sobre sua sexualidade, incluindo acesso à saúde sexual e reprodutiva sem coerção, discriminação ou violência. Trabalharemos ativamente para garantir que os sistemas de saúde ofereçam a informação e os serviços necessários relativos à saúde sexual e reprodutiva das mulheres, buscando inclusive o acesso universal a métodos de planejamento familiar modernos e aceitáveis, que sejam seguros, efetivos e economicamente viáveis, uma vez que isto é essencial para a saúde das mulheres e para o avanço rumo à igualdade de gênero.”

A proposta do G77 (bloco de países) e do Vaticano é cortar o primeiro parágrafo aqui citado por inteiro e, como se isso não bastasse, retirar as especificações em relação a “jovens” do segundo. No texto original a especificação “adolescentes” ainda figurava, mas esta batalha já perdemos. O que preocupa todas e todos as ativistas e os ativistas de gênero, direitos humanos e juventude é perder esta especificação. Pra fechar com chave de ouro, estes governos do G77 e o Vaticano ainda querem cortar as menções à “saúde sexual de reprodutiva” e substituir somente por “saúde”, e cortar tudo que fala de “planejamento familiar”.

E eu com isso?

Como é notório pelas últimas políticas propostas no Brasil sobre o tema, como o Projeto Cegonha, cadastro de gestantes, a proibição do parto em casa e agora pelo Estatuto do Nascituro, já estamos em vias de sofrer estes ataques e termos nossos direitos (ao próprio corpo, à própria gravidez, etc) tirados. Para além das mulheres cissexuais, que em geral têm a possibilidade de engravidar, o texto como querem Vaticano e G77 ainda são nocivos para outros grupos como transexuais, homens e mulheres jovens, adolescentes, comunidade LGBT, etc. Sem estas poderosas menções, não teremos comprometimento oficial nenhum de nosso governos – e de outros – com estas questões que afetam diretamente nossas vidas.

Mas o que posso fazer?

No momento, a pressão precisa ser feita diretamente sobre chefes de Estado, para que não deixem estas modificações serem aprovadas. Aqui no Brasil, especificamente, precisamos que a opinião pública se fortaleça contra estes cortes, fazendo com que nossa Presidenta Dilma Roussef e sua equipe de governo não aceitem esta atrocidade e mantenham-se firmes durante as negociações.
Para isto, repasse estas preciosas informações. Tuite sobre isso, escreva sobre isso, reposte este e outros textos que encontrar sobre o assunto. Envie estas informações a pessoas influentes ou não, comunicadores, jornalistas, veículos de comunicações, blogueiros, ONGs, movimentos sociais. A internet tem sido uma poderosa ferramenta de pressão no Brasil e chegou a hora de a usarmos novamente.

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Camila Silveira

Contatos:
twitter: www.twitter.com/camilace
(85)8866-6035

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Fórum de Mídias Livres acontece na Cúpula dos Povos Rio +20

Centenas de representantes das mídias livres começam a chegar ao Rio de Janeiro  para  a Cúpula dos Povos da Rio+20, evento paralelo à Conferência da ONU sobre desenvolvimento sustentável. Trabalharão para difundir a voz dos povos reunidos na Cúpula e, em vez de falar em manejo do meio ambiente pelo poder econômico, falarão em caminhos para a justiça ambiental e social. Essas mídias terão uma agenda própria dentro da Cúpula, onde se encontrarão para realizar o II Fórum Mundial de Mídias Livres, além de cobrir as atividades e os temas da Rio+20.

Feministas de todo o mundo levarão a visão das mulheres, segmento que teve sua voz excluída da História por séculos, enquanto cuidavam da produção e reprodução da vida.  Elas serão protagonistas nesta Cúpula pelo direito à informação e à liberdade de expressão, pelo conhecimento livre e por  outra comunicação que sirva às comunidades, à cultura e à diversidade. Base de todos os movimentos sociais, as mulheres tem mostrado sua força nas últimas grandes ações transformadoras da História, seja na Primavera Árabe, nas mobilizações europeias  ou nas lutas em curso nos países pobres do sul do planeta.

O feminismo sabe que o patriarcado e o machismo são sustentáculos do capitalismo, assim como a mídia oligopolizada que propagandeia os valores que perpetuam a opressão ao feminino.   As mulheres compartilham e defendem o bem comum e a liberdade de expressão para todos e todas, não apenas para as empresas que dominam o setor.  “Mulher, Mídia e Bens comuns” é o painel específico no II FMML, que agora será na Escola de Comunicação da UFRJ.  Vejam nas matérias como as mulheres bem ocupam espaços na comunicação pública.   Teremos nosso espaço  na Rádio Cúpula,  e com certeza utilizaremos o Laboratório de Comunicação Compartilhada, espaço livre para produção, edição e publicação de forma colaborativa. 


 

terça-feira, 5 de junho de 2012

João Pessoa realiza Marcha das Vadias próximo sábado



“Se não posso dançar, não é minha revolução!” – Emma Goldman

Por Mabel Dias

A Marcha das Vadias (Slut Walk) é um movimento que já acontece mundialmente desde 2011. Seu início se deu na cidade de Toronto, no Canadá, quando um elevado número de estupros de mulheres em uma universidade local fez com que um policial, durante uma palestra sobre segurança, “aconselhasse” as mulheres para não se vestirem como “vadias” para não serem estupradas. Estudantes da universidade canadense se indignaram diante de tal declaração e a reverteram em um protesto político, bem humorado, organizando a primeira Marcha das Vadias, que levou às ruas cerca de três mil pessoas, que se manifestaram publicamente contra a alegação absurda de que as mulheres são violentadas por causa da forma como se vestem.

Mas, só este ano a Marcha das Vadias será realizada em João Pessoa, capital da Paraíba, no próximo sábado, dia 09. Assim como no Canadá, a iniciativa em João Pessoa também partiu de estudantes universitárias. A Marcha das Vadias é uma manifestação, um grito de revolta contra o crescente índice de violência contra mulheres e meninas. Segundo o Mapa da Violência 2012, a Paraíba ocupa o 4º lugar em casos de homicídios contra mulheres e a capital está na 12ª posição.

O índice de violência contra as mulheres no Estado em 2012 é 50% maior em relação ao ano passado. Até abril deste ano, já foram assassinadas 41 mulheres na Paraíba, sendo 26 por crimes machistas e sexistas e 15 por suposto envolvimento com drogas (Fonte: Centro da Mulher 8 de Março). Esses números com certeza devem ser bem maiores, pois a maioria dos casos não chega a ser noticiado na imprensa nem denunciado pelas mulheres.

A fala do policial durante a palestra sobre segurança no campus da universidade canadense reflete o pensamento machista e sexista que permeia a sociedade, seja em qualquer parte do mundo. A mulher ainda é considerada propriedade masculina e o homem se vê no direito de fazer com ela o que quiser. A impunidade ainda é gritante, apesar dos mecanismos de proteção à mulher, como os dispositivos previstos na Lei Maria da Penha.
A violência contra as mulheres e as meninas se dá também na mídia, com seus corpos mercantilizados, jornadas triplas de trabalho, o assédio moral e sexual no trabalho, a pouca cobertura de creches para as mães pobres que precisam trabalhar e não tem onde deixar seus/suas filhas/os, entre outras reivindicações.

Em pleno século XXI, mulheres são oferecidas como presente de aniversário de um irmão para outro, e em seguida estupradas e mortas. Foi o que aconteceu na cidade de Queimadas, na Paraíba, onde cinco mulheres foram estupradas e duas assassinadas. Todos os dias, mulheres e meninas são vítimas da violência, simplesmente por serem do sexo feminino. E ainda por cima, culpabilizadas pela violência que sofrem. Para as lésbicas, negras e pobres esta violência é ainda mais intensa quando essas identidades se articulam entre si, promovendo uma discriminação e preconceito sem precedentes. As mulheres negras estão mais expostas à violência sexual do que as brancas. De 2009 a 2010, no Brasil, a cada hora, duas negras ou pardas foram submetidas à violência sexual (Dados do Laeser/UFRJ).

E é contra esta violência misógina que a Marcha das Vadias se posiciona. Mesmo com o crescimento e a positiva aceitação do movimento Slut Walk no Brasil, posições contrárias ao nome são constantes. A alegação é que o termo soa agressivo e preconceituoso. Para a jornalista Carla Rodrigues, o termo “vadias” tem sido uma irreverente estratégia de deboche do preconceito. Parte da exigência de que os direitos das mulheres não podem ser violentados em nenhuma hipótese, seja lá quem ou como for a vítima. Pauta urgente para o Brasil, onde domésticas, moradores de rua, prostitutas e homossexuais, são agredidos duplamente. A primeira vez, pelo agressor. A segunda, pelas justificativas para a agressão. Passa a ser tarefa da mulher não ser estuprada, enquanto deveria ser responsabilidade do homem não cometer o crime”, diz Carla em seu recente texto “O deboche das Vadias”, publicado no jornal O Estado de São Paulo.

E as vadias vão às ruas na capital da ainda conservadora Paraíba para afirmar que “queremos ser mulheres livres de qualquer tipo de exploração e de opressão e não ficamos caladas diante de uma situação de violência, seja ela física, simbólica ou psicológica... Dizemo-nos “vadias” porque nossos corpos nos pertencem!” (trecho do manifesto das Vadias de João Pessoa)

Acompanhe a Marcha das Vadias JP na internet:
Email: marcha.das.vadias.jp@gmail.com