sábado, 31 de dezembro de 2011

As cenas chocantes do Jornalismo Perícia

Acompanhar os portais da Paraíba tem sido uma tarefa difícil para aqueles que têm o estômago e coração fracos. Matérias recentes de conteúdo e imagens chocantes evidenciam a falta de bom senso de um jornalismo que, pelo que se ver, topa tudo para ampliar os números de acessos ao seu endereço.

Os exemplos desta “modalidade” jornalística são tantos, mas talvez ainda seja necessário um grande artigo científico para descrevê-la. No tal do Jornalismo Perícia é quase impossível saber se as imagens que “ilustram” a notícia foram tiradas pelo perito criminal, e irão compor o processo de investigação, ou pelo repórter fotográfico contratado pelo veículo de comunicação, para “bem informar” o internauta. O que faz com que este “tipo” de jornalismo esteja um nível maior (ou não seria menor?) do espreme que sai sangue sensacionalista. Não basta apenas noticiar um assassinato é preciso expor o sangue, o buraco do tiro, os olhos semiabertos de um corpo ainda quente.

O fato de a imprensa paraibana estar sendo o vetor deste conteúdo grotesco está fundamentado, obviamente, em uma noção equivocada do que é bem informar e estar bem informado. Dessa forma, tanto o jornalista quanto o espectador estão envolvidos no equívoco. Porém não se trata apenas de uma concepção errada da boa informação, neste caso estamos falando também da exploração comercial dos crimes que vitimaram sujeitos, geralmente do sexo masculino, pobres e negros, apresentada como a exposição dos fatos de um jornalismo que não esconde a verdade do povo.

É assustador perceber que grandes veículos de comunicação, como o Sistema Correio, criaram uma verdadeira fábrica ( falamos de uma rotina produtiva que relaciona uma rede de informantes e também de autoridades) para explorar estes acontecimentos, e que a exploração comercial deste conteúdo é tamanha que pipocam blogs e portais especializados no Estado. Se na tevê, as emissoras têm o dever de esfumaçar a imagem para poupar o telespectador da cena, na internet os portais abusam da tag “FOTOS CHOCANTES” para veicular este tipo de conteúdo tranquilamente. A justificativa é de que na rede mundial de computadores a imagem só invadirá sua casa se você quiser. Contudo, os motivos para se preocupar com esta forte evidência de banalização da vida são muitos.

O primeiro deles é de que a justiça não assusta mais. A TV Correio filiada a Rede Record, por exemplo, recebeu uma ação que a multa em 5 milhões de reais e ameaça a legitimidade de sua concessão em outubro de 2011, por ter veiculado na integra cenas de um estupro de uma adolescente. De lá para cá, pouca coisa mudou. O portal da empresa é um dos principais adeptos da prática do Jornalismo Perícia. No dia 29 de dezembro de 2011, às 9h54, o Portal veiculou as imagens de um bebê morto asfixiado e enterrado em uma cova rasa. A criança, que não era desejada pela mãe, foi encontrada depois que cachorros desenterraram o corpo. Embora a notícia seja chocante por si só, não é suficiente relatar o caso, a redação disponibilizou as imagens do crime. Voltando um pouco no tempo, no dia 26 de outubro, o mesmo portal mostrou os pedaços do corpo de detento assassinado e esquartejado no presídio. O leitor pôde ver suas vísceras, sua cabeça e suas pernas e braços expostas em fotografias, provavelmente tiradas por um fotografo amador.

Os corpos expostos são de vítimas cujas famílias poucos recursos terão para defender sua imagem. “A infelicidade de um crime não torna o corpo da vítima objeto do domínio público para que os réus dele possam servir-se com fins lucrativos”. A frase dita por Duciran Farena, Procurador que subscreveu a ação contra o Sistema Correio, é fundamental para refletirmos sobre o desrespeito dos veículos para com as vítimas expostas. Na sua grande maioria, se tratam de vítimas pobres e cujos familiares poucos recursos terão para defendê-las, caso o costumeiro julgamento antecipado esteja equivocado ou mesmo a exposição da imagem do familiar naquela situação incomode.

Além do julgamento precipitado do tribunal da mídia daqueles que são enquadrados pela polícia por algum conflito com a lei e ainda estão vivos para se defender (mesmo que seja em vão), a Mídia não tem poupado julgamentos daqueles que só por estarem mortos já são vítimas sendo criminosos ou não. O Portal MaisPB expôs, no dia 26 de dezembro, às 13h42, as imagens do ex-presidiário e morador de rua conhecido como neguinho, executado a tiros, possivelmente por ter envolvimento no roubo de computadores da Casa da Cidadania localizada próximo ao Centro Histórico de João Pessoa. A chamada da matéria é sarcástica: “FALTA DE SORTE” – Imagens fortes – ladrão tenta fugir após roubo e cai de prédio em João Pessoa.

É interessante pontuar que esta abordagem raríssimas vezes é aplicada em caso nos quais as vítimas tenham poder aquisitivo maior. A imprensa insiste em tratar corpos de homens e mulheres da periferia, excluídos, negros, “das classes perigosas” como objetos do domínio público do qual o jornalismo pode usufruir, simplesmente pelo fato de que estas vítimas provavelmente não terão como processá-los. Melhor pensar que seja por isso mesmo. Imagine se a real justificativa seja motivada pela perspectiva de que por serem pobres e possivelmente delinquentes é natural que devam morrer?

Além disso, cabe resguardar o papel da polícia neste contexto. É ela quem permite, apresenta as vítimas e os detidos e é ela a voz de autoridade para observar os fatos. A imprensa finge não saber e compactua com o esquema. A polícia para mostrar serviço para a população apresenta os “delinquentes” pobres e a imprensa do espreme que sai sangue agradece pela garantia do seu pão de cada dia sem questionar a ação da polícia e as políticas de segurança pública e mesmo sem investigar profundamente esta realidade. Sem dúvidas, é preciso destacar que não é a mídia responsável pela violência, pelos crimes. E sim o sistema social e econômico em que vivemos. Mas é ela o principal instrumento para nos fazer acreditar que a paz social será resultado de uma mera investigação criminal.

Fragilidade para agir contra esta abordagem. Não há nenhuma ferramenta pública onde se registre a produção da mídia no Brasil. Muito embora a tevê desempenhe papel central na história do nosso país, ainda não há nenhum mecanismo de registro do material veiculado que seja de domínio público. O que faz com que o acesso ao material produzido seja atravessado pelos interesses das empresas que só disponibilizam o material se quiserem, tendo possibilidades de alterá-lo, inclusive. O que torna frágil os mecanismos de controle e de cobranças de direitos do telespectador e de resposta. Na internet, a situação é diferente, mas ainda sim é preocupante, já que as informações podem ser apagadas se a administração do portal achar conveniente. Porém a fragilidade para questionar esta abordagem não é grande somente por que podemos não ter as gravações daquilo que assistimos, mas também por que já nos acostumamos de que é assim mesmo e pronto.

A quem devo recorrer se me sentir prejudicado pela exposição de um parente assassinado? A empresa de comunicação vai sugerir que você mude de canal, não acompanhe mais o portal, não compre o jornal. Será esta a democracia da mídia!?

O que torna ainda mais frágil a capacidade de intervir contra é que há uma estrutura econômica e política que sustenta este tipo de jornalismo. Existe audiência e há uma rotina que permite que este conteúdo possa ser capturado, não se trata aqui de censurar o acesso ao espaço do crime, mas preservar, por uma questão de respeito até, a cena, o morto, o desespero da família. Estranho pensar que existem anunciantes que topem apoiar este tipo de conteúdo em tempos em que estar bem no mercado rima com a tal da responsabilidade social.

Nas escolas de comunicação, muitos têm os jornalistas que adotam esta abordagem como os seus favoritos. A formação do comunicador, e digo por seu uma, não é suficientemente crítica com esta realidade. Investe-se cada vez mais nesta abordagem inclusive dentro da sala de aula. Quem estudou Comunicação e não ouviu algum professor dizer que “é assim mesmo! É disso que o povo gosta”? Por isso, não adianta apontar a existência desta abordagem como resultado do período de não obrigatoriedade do diploma. O Jornal Já, por exemplo, é editado por profissionais competentes e formados e é aquilo que é.

É preciso investir em espaços de leitura crítica da mídia em todo o sistema educacional do Brasil e também no processo de formação do comunicador. Compreender que a análise dos nossos meios de comunicação também é a análise da nossa sociedade. Criticar, autocriticar-se deve ser um processo permanente para a melhoria da nossa atuação, jornalistas. A naturalização da exposição e do direito de explorar comercialmente estas imagens é sintoma de um fenômeno social preocupante do qual precisamos refletir, editores, empresários, internautas e toda a sociedade.

Janaine Aires é jornalista, membro do Coletivo COMjunto de Comunicadores Sociais e do Observatório da Mídia Paraibana.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

O papel da mídia na denúncia de maus tratos a animais

FOTO POR INAÊ TELES - PORTAL G1 PARAÍBA


Por Mabel Dias

Nas últimas semanas, me deparei nas redes sociais e na mídia com várias notícias de maus tratos a animais pelo Brasil. Faz um bom tempo que assistindo um destes programas matinais, sou despertada com a informação de que “um ser humano” jogou pelo carro, em um viaduto, na cidade do Rio de Janeiro, dois cachorros. A sorte destes animalzinhos, é que em outro carro que vinha atrás deste, havia uma garota protetora de animais que acolheu os bichinhos. Os dois foram adotados.
Na mesma semana, Cláudio César Messias, arrastou seu cachorro, um rotwelleir, chamado Lobo, pelas ruas de Piracicaba, interior de São Paulo. Ele amarrou o indefeso animal na traseira de uma picape, com uma corda, e o arrastou por aproximadamente 1 km, e ainda deu ré com o carro para passar com as rodas em cima do cão!!!
À polícia, Cláudio César disse que transportava o animal na caçamba do veículo e que tudo não passou de um acidente. Porém, duas testemunhas contaram à polícia que Messias disse que queria matá-lo. Infelizmente, poucos dias depois do ocorrido, Lobo veio a falecer devido a complicações em seu quadro clínico.

Como se não bastasse estas duas barbaridades, em João Pessoa, um funcionário público saiu arrastando um cachorro pelas ruas de Jaguaribe, e ainda tinha colocado um saco plástico encobrindo a cabeça do animal. Por sorte, um rapaz que passava no local gravou a cena e postou na internet, sendo veiculada logo em seguida em um telejornal local. O caso ganhou grande repercussão, sendo inclusive transmitido pelo Jornal Nacional. O cãozinho, que recebeu o nome de Lino,(foto) foi levado por protetoras dos direitos dos animais para uma clínica veterinária, recebeu todos os cuidados de que precisava e hoje foi adotado por uma senhora.

Mas a violência contra os animais não para por aí. Na cidade de Guarulhos, também em São Paulo, no último domingo, 11, outro cachorro foi arrastado por um carro por cerca de 500 metros. Pessoas que viram a cena avisaram a polícia que conseguiu resgatar o cachorro, que recebeu o nome de George, em homenagem a George Harrison, dos Beatles.

Infelizmente, fatos como este não são raros. A questão é que esta violência contra os animais acontece diariamente, seja nas ruas ou dentro de casa mesmo, provocada pelos próprios/as donas/os dos animais. E não são apenas cachorros que a sofrem. Gatos, pássaros, hâmsters, e outros bichos estão expostos a ela. O tráfico de animais também é algo corriqueiro.

Nestes casos que relatei acima a mídia e as redes sociais exerceram um papel muito importante ao noticiar amplamente o que “estes seres humanos” fizeram. A legislação de proteção aos animais é muito branda e prevê apenas o pagamento de uma multa de R$ 1.500 reais para estes crimes, e o agressor fica solto. Foi o que aconteceu com este caso de Guarulhos. Logo após a morte de Lobo, alguns ativistas, publicaram um abaixo assinado na internet para exigir que a punição para quem violenta ou mata animais seja mais rígida. Além destas violências diretas, existem aquelas em que o cachorro que machuque alguma pessoa seja sacrificado (morto) por causa disto. Na maioria destes casos, a responsabilidade é do dono/a do animal, pois eles são treinados/as para ser agressivos e por isto acabam atacando as pessoas. Mas quem paga a pena, e com a vida, são os animais. O abaixo assinado pedindo o fim da impunidade para quem agride animais ainda está on line neste endereço: http://peticaopublica.com.br/?pi=P2011N16665

É um gesto simples, mas que pode fazer diferença. Ainda bem que do outro lado de tanta barbárie, existem grupos e pessoas que amam os animais e os defendem de qualquer maldade. E assim, vão proporcionando alegrias a eles e a outros SERES HUMANOS.