domingo, 19 de fevereiro de 2012

O feminismo no Oriente Médio

LEILA KHALED

Por Mabel Dias, com informações da revista Planeta

“É um mito pensar que toda mulher mulçumana é oprimida”, adverte Soraya Smaili, diretora cultural do Instituto da Cultura Árabe, Icarabe, em São Paulo.

De acordo com ela, estas generalizações acontecem porque há um enorme desconhecimento sobre o que chamamos de mundo árabe, que corresponde geográfico e historicamente, aos países do norte da África e da Península Arábica, do Marrocos ao Barhein, que atraem os países de cultura árabe-islâmica e africana como a Mauritânia, o Sudão e a Somália. Nada tem de árabes os países do Golfo Pérsico, de origem turca, persa ou asiática, que tem como cultura e religião o islamismo, como a Turquia, o Irã, o Afeganistão, o Paquistão e a Indonésia.

Por causa desta diversidade territorial e cultural não é possível falar em “feminismo islâmico”, ou “feminismo árabe”, e sim em “feminismos árabes”. As mulheres no mundo árabe-islâmico começam a se organizar e lutar contra a opressão que há séculos cerceia sua liberdade. Mas ainda há muito por fazer.

O relatório do Fórum Econômico Mundial de 2010, feito em 135 países revela a situação das mulheres nos países da região. Turquia, Barhein, Egito e Iêmen estão entre os países mais atrasados em relação à igualdade de gênero. Foram levados em conta na pesquisa os quesitos participação econômica, o poder político, o acesso à educação e à saúde pelas mulheres.

As revoltas no Oriente Médio, entre elas a que aconteceu no Egito, contra as ditaduras dos governos, mostraram o ativismo das mulheres. Porém, quando os revoltosos conquistam o poder, as mulheres não estão inseridas nem ocupam cargos de relevância. É o que observa Luiza Eluf, procuradora de Justiça do Ministério do Trabalho, no Brasil. As primeiras experiências eleitorais na Tunísia e no Egito confirmaram a popularidade dos partidos islâmicos. “Sinto que temos que escolher entre dois monstros: a ditadura e o extremismo islâmico”, afirma a jornalista libanesa, Joumana Haddad, que também é escritora e editora da revista Jasad (que significa “Corpo”, em árabe), publicação considerada desafiadora e libertária na Líbia. Joumana, que se define como pós-feminista, vem de uma família conservadora e católica, e acredita ser impossível conciliar religião e direito das mulheres. Joumana acredita que a participação da mulher nunca será possível sem que os preceitos patriarcais das três religiões monoteístas sejam totalmente abandonados. “Espero que uma mulher concorra às eleições sem cobrir seu rosto com uma flor”, diz Joumana, se referindo a Marwa al-Qamash, candidata ao parlamento egípcio que optou por trocar seu retrato nos panfletos eleitorais pela imagem de uma rosa. Marwa é do partido fundamentalista El Nur e não acredita que o niqqab (vestimenta que deixa os olhos à mostra por uma fresta), a impeça de assumir um papel político no novo Egito.

Esta divergência entre Joumana e Marwa faz com que pensemos em feminismos árabes. A editora-chefe do Yemen Times, Nadia al-Saqqaf, primeira mulher a ocupar o cargo máximo em um meio de comunicação, afirma que quer mostrar às iemenitas que a mulher pode e deve ser parte da mudança social e dinâmica do país. Nadia defende que o novo governo crie um Ministério da Mulher e adote a política de cotas para cargos eletivos e não eletivos. Ela também propõe mudanças em relação ao sistema de ensino, propondo que desde a primeira lição as meninas se tornem conscientes de seu poder. No Iêmen, país de Nadia, apenas 20% da força de trabalho é composta por mulheres e nenhuma tem lugar no parlamento. Para ela, o islamismo não contradiz a luta feminista.

“Já conquistamos muitos direitos, mas ainda não somos livres para expressá-los nas leis ou na Constituição, porque ainda não somos independentes”, ressaltou a palestina Leila Khaled. A liberdade das palestinas, segundo Leila, passa pelo processo de reconhecimento de seu Estado e pelo fim da ocupação israelense. Leila, que não usa o véu e defende um Estado laico, foi uma das primeiras mulheres a integrar movimentos de resistência armada contra Israel nos anos 70. Hoje ela ocupa uma cadeira no Conselho Nacional Palestino e diz: “O feminismo ocidental é diferente do nosso. Quando falamos sobre nossos direitos, o primeiro é sempre o de resistir”.
Na Arábia Saudita as mulheres enfrentam a dificuldade de lutar por igualdade de gênero, principalmente quando o poder econômico e geoestratégico está em jogo.

A Arábia Saudita é o principal aliado dos Estados Unidos no Oriente Médio e o maior produtor de petróleo do mundo. E o país mais restritivo em relação aos direitos das mulheres. Em 2010, o rei Abdullah concedeu às sauditas o direito de votar e de concorrer às eleições. Mas só em 2015. Mesmo podendo concorrer a cargos eleitorais, as mulheres da Arábia Saudita não podem dirigir, abrir conta em banco ou viajar sem autorização. Além de não poder defender seus direitos em público. “Não posso falar com nenhum meio de comunicação estrangeiro. Estou sob observação da polícia”, revela Wajeha al-Huwaider, fundadora da Sociedade de Defesa dos Direitos da Mulher na Arábia Saudita.

MPF/SP quer retratação por comentários homofóbicos em programa evangélico

A Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão em São Paulo quer que o programa “Vitória em Cristo”, exibido pela Rede Bandeirantes, veicule uma retratação pelos comentários homofóbicos feitos pelo pastor Silas Malafaia, no programa de 02 de julho de 2011. Utilizando gírias de baixo calão, o pastor defendeu “baixar o porrete” e “entrar de pau” contra integrantes da Parada Gay. A retratação deverá ter, no mínimo, o dobro do tempo utilizado nos comentários preconceituosos. A ação foi proposta hoje e tramitará em uma das varas cíveis da Justiça Federal de São Paulo.

“Os caras na Parada Gay ridicularizaram símbolos da Igreja Católica e ninguém fala nada. É pra Igreja Católica 'entrar de pau' em cima desses caras, sabe? 'Baixar o porrete' em cima pra esses caras aprender (sic). É uma vergonha”, afirmou o pastor evangélico, durante o programa. A associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais protocolou reclamação no Ministério Público Federal, o que motivou a abertura, pela PRDC, de um inquérito civil público para apurar o caso.

No curso do inquérito, Malafaia explicou à PRDC que tinha feito uma “crítica severa a determinadas atitudes de determinadas pessoas desse segmento social, acrescida também de reflexão e crítica sobre a ausência de posicionamento adequado por parte das pessoas atingidas”. E defendeu que as expressões “baixar o porrete” ou “entrar de pau” significam “formular críticas, tomar providências legais”.

Para o procurador regional dos direitos do cidadão Jefferson Aparecido Dias as gírias têm claro conteúdo homofóbico, por incitar a violência em relação aos homossexuais. “Mais do que expressar uma opinião, as palavras do réu em programa veiculado em rede nacional configuram um discurso de ódio, não condizente com as funções constitucionais da comunicação social”, disse.

Durante o inquérito, Silas Malafaia pediu a seus fiéis, através do site “Verdade Gospel”, que enviassem e-mails em sua defesa ao procurador da República responsável pelo caso. Centenas de e-mails e correspondências foram, então, enviados ao gabinete de Dias. “Da mesma forma que seus seguidores atenderam prontamente o seu apelo para o envio de tais e-mails, o que poderá acontecer se eles decidirem, literalmente, “entrar de pau” ou “baixar o porrete” em homossexuais?”, questiona o procurador.

Dias afirma que, como líder religioso, Malafaia é formador de opiniões e moderador de costumes. “Ainda que sua crença não coadune com a prática homossexual, incitar a violência ou o desrespeito a homossexuais extrapola seus direitos de livre expressão”, argumentou. Por isso, a importância da retratação de seus comentários homofóbicos diante de seus telespectadores, além da abstenção de veicular novas mensagens homofóbicas.

A ação também é movida contra a TV Bandeirantes, a quem cabe evitar que outras mensagens homofóbicas sejam exibidas, além de veicular a retratação pedida pela PRDC. “A emissora é uma concessionária do serviço público federal de radiofusão de sons e imagens e deve compatibilizar sua atuação com preceitos fundamentais como o direito à honra e à não discriminação”, defende a ação.

“Ainda que haja a liberdade de culto e a liberdade de expressão, também previstas na Constituição Federal, a manifestação do pensamento não pode ser utilizada como justificativa para ofensa de direitos fundamentais alheios”, afirma o procurador.

A PRDC pede que seja concedida liminar para que Silas e Band sejam obrigados a se abster de exibir novas agressões verbais. Ao final da ação, uma vez condenados o pastor e a emissora, o MPF requer que o programa evangélico e a emissora sejam condenados a exibir, imediatamente, a retratação.

Dias lembra que a TV está presente em pelo menos 90,3% dos municípios brasileiros. “Trata-se de número enorme de pessoas expostas ou passíveis de exposição a manifestações de cunho homofóbico ou que incitem a violência de homossexuais”, afirma. Para ele, a demora judicial pode permitir que o réu continue “propagando tais mensagens, atentando continuamente contra direitos fundamentais de homossexuais”.

A ação também pede que a União seja condenada a, por meio da Secretaria de Comunicação Eletrônica do Ministério das Comunicações, fiscalizar a referida exibição.
FONTE: Assessoria de Comunicação da Procuradoria da República de São Paulo.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

O assassinato de mais um jovem negro no Brasil

Por Mabel Dias

O assassinato do jovem Gualter Rocha, no Rio de Janeiro, no dia 1º de janeiro de 2012, me fez refletir sobre a violência urbana que temos assistido cotidianamente e a insuflação, direta ou indireta por parte de alguns jornalistas e outros segmentos da sociedade a reagir sob a máxima “olho por olho, dente por dente”

Gualter que adorava dançar, e foi o idealizador do “passinho”, no funk carioca, gritava por socorro por onde passava. Dizia que estava sendo perseguido. As câmeras de vigilância de uma empresa gravaram o jovem correndo desesperadamente, mas não mostraram quem estaria atrás dele. Pedindo ajuda em várias casas, ele conseguiu entrar em uma, onde morava um casal de idosos e sua filha. Atordoado, Gualter continuava pedindo abrigo, mas o casal, assustado, entrou na casa e nada fez.

A polícia prendeu dois suspeitos de terem matado o rei do passinho. O supervisor de uma empresa de segurança e um dos vizinhos do casal de idosos. De acordo com o laudo do Instituto Médico Legal, Gualter foi morto por asfixia mecânica, ou seja, estrangulado. Um dos acusados disse que o que o matou foram as drogas. Mas o exame feito no adolescente mostrou que não havia nenhuma substância em seu sangue. Antes de ser asfixiado, Gualter foi brutalmente espancado e seu corpo foi arrastado até a rua.

O casal, que não conhecia o rapaz, ficou obviamente assustado e se recolheu. O medo deles com certeza deve estar associado a tantas notícias de caso de violência que vem tomando conta do país. Não o ajudaram. Gualter estava sozinho e não estava armado. Pedia proteção. Mas a vontade de fazer justiça com as próprias mãos fez com que o segurança e o vizinho do casal matassem Gualter. Um jovem que tinha tudo pela frente e que foi morto por ter sido confundido com “um meliante, elemento”, termos usados constantemente pela polícia e pela própria imprensa para se referir a assaltantes. Não perguntaram nada, apenas bateram e mataram.

E será que é desta forma que o problema da violência no Brasil será solucionado? Reforçando a prática de atos violentos como resposta a outros atos violentos? É desta forma que a imprensa pensa e acredita estar ajudando a mudar o quadro ao qual toda a sociedade brasileira está passando? É incentivando a população a se armar que alguns jornalistas pensam que vão solucionar os índices de assassinatos no país?

Gualter, assim como muitos adolescentes brasileiros, poderia estar vivo, brilhando nos palcos dos bailes e shows de funk, como também em alguns programas de TV, como o de Regina Casé, onde era presença marcante. Gualter – é horrível dizer isto, mas é verdade, faz parte das estatísticas dos diagnósticos realizados pelos mapas da violência que revela o alto índice de assassinato de jovens pobres e negros no Brasil. E fica por isto mesmo. Isto a imprensa não fala tão pouco reflete o porquê que isto acontece. A fala do segurança, suposto assassino de Gualter, revela o pensamento bastante comum na sociedade: o envolvimento com drogas que leva a morte destes jovens. É fácil dizer: morreu porque estava envolvido com o tráfico de drogas. Não era o caso de Gualter e de tantos outros jovens brasileiros. E fica por isto mesmo?

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Labdebug: a experiência da produção digital das mulheres


Uma das dificuldades do grupo é encontrar professoras especialistas na área de tecnologia.


Por Mabel Dias

A cultura digital com um olhar de gênero: a experiência de produção digital das mulheres. Esta foi a atividade realizada pela professora de comunicação social da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Graciela Natanshon, durante o I Encontro Nacional sobre o Direito à Comunicação, que aconteceu no Recife, até este sábado (11).

Graciela faz parte, com outra professora, Karla Brunet, do GIG@ - Grupo de Pesquisa em Gênero, Tecnologias Digitais e Cultura e coordena o projeto de pesquisa e extensão “Mulheres e Tecnologia: teoria e práticas na cultura digital”, também conhecido por Labdebug.

“O Labdebug é um espaço de produção digital dirigido às mulheres, feito por mulheres, usando software livre e analisando e incentivando o acesso das mulheres as tecnologias”, informa Graciela, que é mestra e doutora em Comunicação pela Universidade Nacional de La Plata. Ela aponta quatro razões para estudar a mídia digital com perspectiva de gênero: as mulheres precisam acabar com o mito de que a tecnologia é coisa de homens; mulheres são objetos e não sujeitos nas tecnologias; as mulheres pouco participam das decisões sobre a infraestrutura técnica e lógica das redes digitais e as mulheres são subestimadas e exploradas na web. “Pornografia, exploração da imagem, tráfico internacional de mulheres, venda de serviços sexuais gerenciada por exploradores, fazem parte da paisagem da web. Amor, sexo, moda, beleza, consumo, futilidades e vida doméstica são as categorias associadas à mulher, numa “googleada” rápida. Se o pessoal é político, como foi dito faz mais de 40 anos, devemos politizar a web, assumir nosso lugar como sujeit@s, produzir conteúdos e criar redes que sirvam aos próprios interesses.”, afirma Graciela Natanhson.

As alunas do Labdebug aprendem nas oficinas –aulas a montar e desmontar micros, instalar software, criar wikis e blogs, produzir vídeo digital, manipulação de câmaras e computadores em tempo real, edição, DJ e VJS, e ainda realizam performances com tecnologia, experimentações com sensores, streamings e vídeos, que receberam o título de “Arte, Corpo e Tecnologia”

“A tecnologia também precisa ser um tema incluído como prioritário na agenda feminista brasileira” atenta Graciela. De acordo com pesquisa do IBGE de 2009/2010, as mulheres tem acessado cada vez mais a internet, mas elas não estão nas tomadas de decisões sobre tecnologia digital (ministérios, empresas, educação e tecnologia da informação) e o movimento de software livre raramente discute a inclusão das mulheres. “No Comitê Gestor de Internet há apenas duas mulheres, representando o terceiro setor. No Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, a maioria esmagadora dos cargos políticos são de homens. Os artefatos técnicos são conformados pelas relações, significados e identidades de gênero; hierarquias da diferença sexual afetam o desenvolvimento, a difusão e o uso e apropriação da tecnologia. Se as mulheres não participam do desenho e planejamento das tecnologias, mal podem ser contemplados seus interesses.”, ressalta.

O que é Labdebug - Bug e debug são termos bastante usados na Informática, hoje. Quando um programa dá “erro”, se diz que há um bug ( e o debug resolveria o problema). Contudo, foi lá em 1945, enquanto Grace Murray Hopper (1906-1992) trabalhava num software para o computador Mark I, que a máquina parou de funcionar. Procurando o problema achou uma mariposa (bug) no meio dos circuitos da máquina e, ao retirá-la (debugging), a máquina voltou a funcionar.

Para conhecer mais sobre o Labdebug, o Gig@ e a participação das mulheres na área de tecnologia, acesse http://labdebug.net/labdebug/ e http://gigaufba.wordpress.com/

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Encontro discute democratização da comunicação e reforma política

Paula de Andrade (*)

"O Estado brasileiro deve adotar medidas de regulação democrática sobre a estrutura do sistema de comunicações, a propriedade dos meios e os conteúdos veiculados, de forma que diferentes grupos sociais, culturais, étnico-raciais e políticos possam se manifestar em igualdade de condições no espaço público midiático." Isso requer diversas medidas. Entre elas: "O Estado precisa garantir as condições para a participação popular na tomada de decisões acerca do sistema de comunicações brasileiro, no âmbito dos poderes Executivo e Legislativo."

O trecho acima, adaptado da Plataforma para um novo Marco Regulatório das Comunicações no Brasil, é o “coração” do debate que o SOS Corpo – Instituto Feminista para a Democracia, as Loucas de Pedra Lilás e a Abong se propõem a animar durante o Encontro Nacional sobre o Direito à Comunicação (ENDC), na tarde do dia 10 de fevereiro, quando acontecem as atividades autogestionadas.

Apesar de uma conjuntura bastante adversa para os movimentos sociais, “o pulso ainda pulsa” e a Oficina“Vamos mudar a política no Brasil! Pela participação popular nas decisões sobre o sistema de comunicações brasileiro” pretende partir de uma perpepção bastante assentada entre as análises sobre a direito à comunicação no Brasil: os visíveis pontos de confluência entre a atual estrutura e organização dos meios de comunicação e o perfil de parlamentares do Congresso Nacional.

Não é de hoje que percebemos como essas estruturas se retroalimentam na manutenção de uma hegemonia e de pensamentos conservadores. No contexto atual, pelo perfil majoritariamente conservador de parlamentares do Congresso Nacional, o contexto parece nos impor o enfrentamento do descrédito na política como uma prioridade. Isso porque trata-se, cada vez mais, de um descrédito que interessa às oligarquias políticas que se mantém no poder e porque tem sido intensamente reforçado a partir da estrutura de mídia da qual dispõem. De maneira muito ampla, podemos falar de muitas ações que, mesmo sem um foco no enfrentamento desse descrédito, fortalecem esta perspectiva, propondo a política como um exercício de cidadania, um exercício de todas e de todos. Neste sentido, temos a criação do Fórum Social Mundial, o Fórum de Mídia Livre, as diversas experiências de Cúpulas dos Povos, as diferentes ações LGBT contra a heteronormatividade... E, mais recentemente, os protestos contra a transposição do São Francisco e a implantação da central hidrelétrica de Belo Monte, as Marchas das Vadias mundo afora, as manifestações Occupy, a articulação mundial contra a implantação do S.O.P.A. (Stop Online Piracy Act) e o P.I.P.A (Protect IP Act), a cobertura na Internet da barbárie ocorrida em Pinheirinho (São Paulo), além de inúmeras manifestações locais, como os protestos da população do Recife contra o aumento das passagens...

Em todos estes atos estamos agindo para evitar que outros e poucos, decidam por nossas vidas ou definam como devemos viver. Participamos politicamente e semeamos a democratização do poder a partir de muitas expressões. Mas, no caso em questão, o que fazer? Para enfrentar os problemas que visualizamos, nós dos movimentos sociais juntamos nossas forças, trocamos ideias e saberes, e também aproveitamos a oportunidade de uma oficina no ENDC para refletir sobre como atuar - coletivamente - para transformar a relação entre os mecanismos da democracia representativa e os entraves à democratização da comunicação no país. O esforço de pensar sobre isso ganhou novo impulso desde 2005, quando foram realizados seminários e debates reunindo várias organizações da sociedade civil, que resultaram numa compreensão mais ampla sobre a reforma do sistema político que desejamos. Foi neste processo que entrou em cena o eixo da democratização da comunicação na Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político.

Desde então, diversas organizações têm trabalhado para enfrentar os entraves à participação política atacando o que consideram ser as estruturas do sistema político. Atualmente, a prioridade dos movimentos sociais reunidos na Plataforma é a luta por uma reforma política que amplie, no parlamento, a representação das mulheres, da população negra, do povo indígena, das pessoas em situação de pobreza, da população do campo e moradoras/es da periferia urbana, da juventude e da população homoafetiva, entre outro grupos sociais.

Para o SOS Corpo, as Loucas de Pedra Lilás e a Abong, esta perspectiva precisa ser discutida no plano do direito à comunicação, pelas conexões que já citamos entre a democracia representativa e os obstáculos à democratização da comunicação. Não basta nos reunirmos ou reunirmos organizadamente nossas propostas, como aconteceu na I Conferência Nacional de Comunicação. Para avançarmos, acreditamos ser necessário que mais pessoas estejam convencidas que não será possível aprofundarmos a democracia sem uma ampla reforma do sistema político que leve em conta a democratização da comunicação. E que todas/os que por ela lutam também articulem com as mudanças necessárias no plano da democracia representativa. No dizer da Plataforma, isso significa, por exemplo, “garantir o poder do povo para revogar mandatos parlamentares, acabar com os privilégios de férias de 60 dias, 14º e 15º salários e o uso do mecanismos de imunidade parlamentar em situações que só servem para promover a impunidade.” Além disso, precisamos de uma nova regulamentação dos instrumentos de democracia direta: plebiscito, referendo e projeto de iniciativa popular, que possibilite a participação popular nas decisões, não apenas nos momentos eleitorais.

No Brasil, o Executivo precisa assumir a pauta por um novo marco regulatório das comunicações e provocar o Legislativo. E para que nossos anseios sejam acolhidos, o Legislativo precisa ser democratizado de forma que todos os segmentos da população estejam representados, incluindo os mesmos “diferentes grupos sociais, culturais, étnico-raciais e políticos” que não conseguem se manifestar em igualdade de condições no espaço público midiático. Com as regras atuais do sistema político brasileiro, isso não é possível. As eleições “repõem” nas casas do Legislativo inúmeros parlamentares que, em sua maioria, representam as elites: donos de bancos, de terras e de veículos de comunicação.

Durante o ENDC, estará no horizonte do nosso debate: "como ampliar o poder do povo nas decisões no plano da democratização da comunicação? Participe conosco, se você se sente conectado/a com esta pauta. Envie desde já suas ideias e suas experiências, pois podemos continuar esta reflexão em outros momentos e via outras articulações.

Fontes: http://www.reformapolitica.org.br/ | http://www.comunicacaodemocratica.org.br/



(*) Paula de Andrade integra a equipe do SOS Corpo – Instituto Feminista para a Democracia e o coletivo de comunicação da Articulação de Mulheres Brasileiras.

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