Paula de Andrade (*)
"O Estado brasileiro deve adotar medidas de regulação democrática sobre a estrutura do sistema de comunicações, a propriedade dos meios e os conteúdos veiculados, de forma que diferentes grupos sociais, culturais, étnico-raciais e políticos possam se manifestar em igualdade de condições no espaço público midiático." Isso requer diversas medidas. Entre elas: "O Estado precisa garantir as condições para a participação popular na tomada de decisões acerca do sistema de comunicações brasileiro, no âmbito dos poderes Executivo e Legislativo."
O trecho acima, adaptado da Plataforma para um novo Marco Regulatório das Comunicações no Brasil, é o “coração” do debate que o SOS Corpo – Instituto Feminista para a Democracia, as Loucas de Pedra Lilás e a Abong se propõem a animar durante o Encontro Nacional sobre o Direito à Comunicação (ENDC), na tarde do dia 10 de fevereiro, quando acontecem as atividades autogestionadas.
Apesar de uma conjuntura bastante adversa para os movimentos sociais, “o pulso ainda pulsa” e a Oficina“Vamos mudar a política no Brasil! Pela participação popular nas decisões sobre o sistema de comunicações brasileiro” pretende partir de uma perpepção bastante assentada entre as análises sobre a direito à comunicação no Brasil: os visíveis pontos de confluência entre a atual estrutura e organização dos meios de comunicação e o perfil de parlamentares do Congresso Nacional.
Não é de hoje que percebemos como essas estruturas se retroalimentam na manutenção de uma hegemonia e de pensamentos conservadores. No contexto atual, pelo perfil majoritariamente conservador de parlamentares do Congresso Nacional, o contexto parece nos impor o enfrentamento do descrédito na política como uma prioridade. Isso porque trata-se, cada vez mais, de um descrédito que interessa às oligarquias políticas que se mantém no poder e porque tem sido intensamente reforçado a partir da estrutura de mídia da qual dispõem. De maneira muito ampla, podemos falar de muitas ações que, mesmo sem um foco no enfrentamento desse descrédito, fortalecem esta perspectiva, propondo a política como um exercício de cidadania, um exercício de todas e de todos. Neste sentido, temos a criação do Fórum Social Mundial, o Fórum de Mídia Livre, as diversas experiências de Cúpulas dos Povos, as diferentes ações LGBT contra a heteronormatividade... E, mais recentemente, os protestos contra a transposição do São Francisco e a implantação da central hidrelétrica de Belo Monte, as Marchas das Vadias mundo afora, as manifestações Occupy, a articulação mundial contra a implantação do S.O.P.A. (Stop Online Piracy Act) e o P.I.P.A (Protect IP Act), a cobertura na Internet da barbárie ocorrida em Pinheirinho (São Paulo), além de inúmeras manifestações locais, como os protestos da população do Recife contra o aumento das passagens...
Em todos estes atos estamos agindo para evitar que outros e poucos, decidam por nossas vidas ou definam como devemos viver. Participamos politicamente e semeamos a democratização do poder a partir de muitas expressões. Mas, no caso em questão, o que fazer? Para enfrentar os problemas que visualizamos, nós dos movimentos sociais juntamos nossas forças, trocamos ideias e saberes, e também aproveitamos a oportunidade de uma oficina no ENDC para refletir sobre como atuar - coletivamente - para transformar a relação entre os mecanismos da democracia representativa e os entraves à democratização da comunicação no país. O esforço de pensar sobre isso ganhou novo impulso desde 2005, quando foram realizados seminários e debates reunindo várias organizações da sociedade civil, que resultaram numa compreensão mais ampla sobre a reforma do sistema político que desejamos. Foi neste processo que entrou em cena o eixo da democratização da comunicação na Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político.
Desde então, diversas organizações têm trabalhado para enfrentar os entraves à participação política atacando o que consideram ser as estruturas do sistema político. Atualmente, a prioridade dos movimentos sociais reunidos na Plataforma é a luta por uma reforma política que amplie, no parlamento, a representação das mulheres, da população negra, do povo indígena, das pessoas em situação de pobreza, da população do campo e moradoras/es da periferia urbana, da juventude e da população homoafetiva, entre outro grupos sociais.
Para o SOS Corpo, as Loucas de Pedra Lilás e a Abong, esta perspectiva precisa ser discutida no plano do direito à comunicação, pelas conexões que já citamos entre a democracia representativa e os obstáculos à democratização da comunicação. Não basta nos reunirmos ou reunirmos organizadamente nossas propostas, como aconteceu na I Conferência Nacional de Comunicação. Para avançarmos, acreditamos ser necessário que mais pessoas estejam convencidas que não será possível aprofundarmos a democracia sem uma ampla reforma do sistema político que leve em conta a democratização da comunicação. E que todas/os que por ela lutam também articulem com as mudanças necessárias no plano da democracia representativa. No dizer da Plataforma, isso significa, por exemplo, “garantir o poder do povo para revogar mandatos parlamentares, acabar com os privilégios de férias de 60 dias, 14º e 15º salários e o uso do mecanismos de imunidade parlamentar em situações que só servem para promover a impunidade.” Além disso, precisamos de uma nova regulamentação dos instrumentos de democracia direta: plebiscito, referendo e projeto de iniciativa popular, que possibilite a participação popular nas decisões, não apenas nos momentos eleitorais.
No Brasil, o Executivo precisa assumir a pauta por um novo marco regulatório das comunicações e provocar o Legislativo. E para que nossos anseios sejam acolhidos, o Legislativo precisa ser democratizado de forma que todos os segmentos da população estejam representados, incluindo os mesmos “diferentes grupos sociais, culturais, étnico-raciais e políticos” que não conseguem se manifestar em igualdade de condições no espaço público midiático. Com as regras atuais do sistema político brasileiro, isso não é possível. As eleições “repõem” nas casas do Legislativo inúmeros parlamentares que, em sua maioria, representam as elites: donos de bancos, de terras e de veículos de comunicação.
Durante o ENDC, estará no horizonte do nosso debate: "como ampliar o poder do povo nas decisões no plano da democratização da comunicação? Participe conosco, se você se sente conectado/a com esta pauta. Envie desde já suas ideias e suas experiências, pois podemos continuar esta reflexão em outros momentos e via outras articulações.
Fontes: http://www.reformapolitica.org.br/ | http://www.comunicacaodemocratica.org.br/
(*) Paula de Andrade integra a equipe do SOS Corpo – Instituto Feminista para a Democracia e o coletivo de comunicação da Articulação de Mulheres Brasileiras.
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