terça-feira, 21 de agosto de 2012

Aborto seguro: um direito das mulheres?

 Por Nilcéia Freire

A discussão sobre o aborto no país e a primazia das mulheres em tomarem a decisão sobre sua realização foi, desde sempre, revestida de grande simbolismo posto que confronta a sociedade com temas "intocáveis", como o início da vida humana e a "propriedade" sobre os corpos femininos.

Nos últimos anos e, especialmente a partir da I e da II Conferências Nacionais de Políticas para as Mulheres, o tratamento do tema ganhou novos contornos. A aprovação da resolução que demandava ao governo brasileiro iniciativas que viessem a rever, no sentido descriminalizante, a legislação brasileira, inseriu a questão do aborto no campo de discussão das políticas públicas, mais especificamente, no âmbito da saúde pública.

Por outro lado, vale registrar que no Brasil, seguindo uma tendência mundial, houve no mesmo período um acentuado crescimento e/ou explicitação de posições conservadoras quanto ao tema, por parte de diferentes grupamentos religiosos que ampliaram sua força política no Congresso Nacional.

Na sociedade brasileira, apesar da legislação restritiva e criminalizante, a prática clandestina do aborto ocorre em escala que coloca em risco a vida de milhares de mulheres, sobretudo nos extratos de renda mais baixos da população, configurando-se, desta maneira, como a quarta causa de morte materna no Brasil.

Estima-se que, em 2005 (1), para cada 100 nascidos vivos ocorreram 30 abortos realizados em condições inseguras e precárias. Em termos de mortalidade materna, se aprofundarmos as estatísticas, considerando os aspectos socioeconômicos, verificamos que as maiores vítimas são mulheres negras e pobres. A desagregação dos dados em relação ao quesito raça e cor elucida parte da desigualdade étnico-social entre as brasileiras: das mortes maternas causadas pelo aborto em 2004, aproximadamente 9% eram mulheres brancas e 20% eram negras (2).

Em 2009, foi apresentado um estudo financiado pelo Ministério da Saúde, "20 anos de pesquisa sobre o aborto no Brasil", coordenado por Débora Diniz e Marilena Corrêa, em que se revela o perfil das mulheres que realizam o aborto no Brasil, concluindo-se que são, predominantemente, mulheres entre 20 e 29 anos, em união estável, com até oito anos de estudo, trabalhadoras e católicas. Os resultados da pesquisa põem por terra o estereótipo de que somente mulheres "irresponsáveis" e "inconsequentes" recorrem ao aborto como solução para o problema da gravidez indesejada e o reposiciona como opção, via de regra difícil, de mulheres e, porque não dizer, de homens, que por diferentes razões vivenciam essa contingência de vida.

Independentemente das condições econômicas, sociais, de escolaridade, entre outras, em que se encontram essas mulheres, a criminalização da prática do aborto as iguala sonegando-lhes o direito à saúde e impondo-lhes as consequências no campo psíquico e social de uma gravidez não desejada.

As mulheres que recorrem ao aborto inseguro ou clandestino ficam expostas ao risco dos agravos a sua saúde e até a morte, além do sofrimento moral de um processo judicial que pode levar à condenação. O caso das dez mil mulheres de Mato Grosso do Sul é exemplar no sentido de demonstrar as possíveis consequências de uma legislação tão anacrônica quanto injusta.

Ao avaliar o VI Relatório Nacional Brasileiro, o Comitê de Eliminação da Discriminação contra Mulheres das Nações Unidas, recomendou, juntamente com outras medidas, que o país proceda à revisão da legislação, com vistas à descriminalização do aborto, e que prossiga com seus esforços para aumentar o acesso das mulheres à assistência à saúde, em particular aos serviços de saúde sexual e reprodutiva, o que inclui a assistência aos casos e às complicações decorrentes de abortos não seguros. Tal recomendação se fundamenta nos dados sobre morte materna em consequência de abortamento inseguro.

As recomendações do Comitê revalidam e reforçam os compromissos assumidos pelo país em diferentes instrumentos internacionais, por meio dos quais se reconhece que a exposição aos riscos de um abortamento inseguro implica em violação dos direitos humanos de meninas e mulheres, a exemplo da Declaração de Viena, de 1993, e que direitos sexuais e reprodutivos são direitos humanos, conforme a definição resultante da IV Conferência Mundial sobre a Mulher, em Pequim, em 1995. O compromisso do Estado brasileiro expresso nesses instrumentos é claro no sentido da abordagem do aborto como problema de saúde pública e da necessidade de rever a legislação restritiva e punitiva sobre o tema.

Urge, portanto, aprofundar o debate entre nós com a delicadeza que o assunto merece e com a consciência da polêmica que desperta. Sendo partícipe da Convenção sobre a Elimi nação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, o Estado brasileiro deve garantir os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres brasileiras através da discussão livre e informada.

Para isso, é imprescindível superar os paradigmas estigmatizantes do machismo e do sexismo que obstaculizam a verdadeira promoção da igualdade entre homens e mulheres e avançar rumo a uma sociedade garantidora da totalidade dos direitos humanos.

Urge enfrentar o debate sobre o aborto com a consciência da proporção de seus impactos na vida das mulheres. E aqui, cabe lembrar o julgamento da Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 54 sobre a interrupção de gestações de fetos anencéfalos que, felizmente, teve parecer favorável do Supremo Tribunal Federal.

Ainda que delicada e difícil a discussão sobre o tema, o aborto está, mais do que nunca, em pauta e à sociedade brasileira, e em especial às mulheres, cabe decidir sobre qual devem ser os próximos passos.

Nilcéa Freire é médica e professora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). Foi ministra da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (2004-2010).
 Texto publicado na edição de abril/junho 2012 da Revista Ciência e Cultura. 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Adesse, L.; Monteiro, M.F.G.. In: Ipas Brasil. Disponível em: http://www.ipas.org.br/arquivos/factsh_mag.pdf (acesso em 2/2/10)

2. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Painel de Indicadores do SUS. Vol.1, 2008. Disponível em: http://portal.saude.gov.br/portal/ arquivos/pdf/painel_%20indicadores_do_SUS.pdf (acesso em 2/2/10).

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Feministas autônomas enviam carta a Ministra das Mulheres pedindo libertação das Pussy Riot


Cara Ministra Eleonora Menicucci

Nós, feministas e mulheres ativistas de diversos movimentos sociais, vimos `a presença da Ministra cientes da importância histórica com que se apresenta o episódio da condenação das três feministas russas integrantes do grupo Pussy Riot.

Entendemos que foram condenadas por terem denunciado, em sua performance política e artística, a aliança de poder entre o presidente e o patriarca da igreja ortodoxa russa, uma aliança cujo poder se reafirmou com violência na pena de dois anos em um campo de trabalho "corretivo".

Sabemos o que representam para as mulheres as alianças entre estes dois tipo de poder, o Estatal e o Religioso, particularmente para nós ativistas políticas. Não por acaso durante o processo surgiram afirmações por parte da acusação do tipo "o feminismo é um pecado mortal" e alusões ao estado de "possessão" das artistas/ativistas. A descaracterização de ato como ato político e o foco na "blasfêmia" foi o eixo mais marcante das justificações para a arbitrária condenação.

Afirmamos, senhora Ministra, que esse tipo de criminalização do agir político com argumentos religiosos não é um fato isolado dentro do contexto internacional, considerando o crescente protagonismo de todos os tipos de fundamentalismos, inclusive entre nós.

Reiteramos a nossa repulsa e nossa resistência a essas práticas.

Convocamos, por isso, a Ministra Menicucci, cuja trajetória de vida, marcada pelo totalitarismo e pela violência de Estado, a fazer gestões junto ao governo, para que o Brasil se posicione nos foruns da ONU no sentido de instar o governo russo a suspender a condenação, oferecendo `a opinião internacional um gesto de retorno ao respeito das liberdades democráticas.

Temos certeza de que a Ministra contará com o firme apoio da Senhora Presidenta Dilma Roussef, igualmente condenada por suas idéias e sua luta por igualdade e justiça.

Certas do seu comprometimento com nossas demandas

Subscrevemo-nos atenciosamente,
Carta para a Ministra Eleonora Menicucci
se apoiar mande para suas redes e encaminhe para a SPM
spmulheres@spmulheres.gov.br

domingo, 1 de julho de 2012

Mapa da violência revela aumento da violência contra a mulher no Brasil




A cada duas horas, uma mulher é assassinada no Brasil e os crimes acontecem dentro de casa. É o que revela o Mapa da Violência 2012, documento elaborado pelo Instituto Sangari, publicado em abril deste ano.
O Mapa traz um panorama referente aos homicídios ocorridos no Brasil em 2010, e traz um Caderno Complementar 1, sobre Homicídios de Mulheres no Brasil. O autor do mapeamento, Julio Jacobo Waiselfisz declara que "São poucas as informações sobre o tema que encontramos disponíveis ou que cir­culam em âmbito nacional. Dada a relevância da questão, julgamos oportuno elaborar um estudo específico e divulgá-lo separadamente.”

Os dados que balizaram o estudo Sangari, não dispõem de dados de gênero que possam evidenciar o caráter desses crimes como crimes de gênero. Mas, nos estudos sobre violência já existe um consenso quanto ao fato que a violência tem um caráter de gênero e nos estudos sobre assassinatos de mulheres mais de 90% ocorrem por questão de gênero, são feminicídios.

 A fonte dos dados que fundamentaram o mapeamento foi o Sistema de Informações de Mortalidade – SIM – da Secretaria de Vigilância em Saúde – SVS – do Ministério da Saúde – MS, que fornece dados relativos à idade, sexo, estado civil, profissão e local de residência da vítima e da ocorrência da morte. A causa da morte se baseia na indicação de mortes por agressão de terceiros.

Apresentando uma perspectiva histórica dos homicídios, o relatório revela que entre 1980 e 2010 foram assassinadas aproximadamente 91 mil mulheres no país, passando de 1.353 para 4.297 mortes, um aumento de 217,6% nas mulheres vítimas de assassinato, sendo 43,5 mil só na última década (2000 – 2010). A taxa desses assassinatos para cada grupo de 100 mil mulheres passou de 2,3 em 1980, para 4,4 em 2010. Isso representa uma média de 4.350 mulheres assassinadas por ano, 362,5 por mês, 12,1 por dia.

Esse estudo identifica o ano de 1996 como um corte de aumento, quando o número desses crimes duplicou, permanecendo até o momento nos mesmos patamares. O Mapa ressalta que, em 2007, ano seguinte à criação da Lei Maria da Penha (2006), de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher, houve uma pequena redução que levou essa taxa para 3,9, mas retomando imediatamente os níveis anteriores. Com base nos dados de 2010, as armas utilizadas nesses crimes foram em 53% dos casos armas de fogo e o restante é representado por objetos cortantes e perfurantes (26%), contundentes (8,3) e estrangulamento ou sufocação (6,2) e outros meios (5,5). A residência foi apontada em 40% das ocorrências como o local em que as mulheres foram assassinadas.

Em termos absolutos São Paulo registrou o maior número, 663 assassinatos de mulheres e Roraima o menor com 11 casos. Por cada 100 mil mulheres, a maior proporção foi encontrada em Espírito Santo, 9,4 e a menor no Piauí com 2,6. O estado do Ceará teve 165 mulheres assassinadas naquele ano, ocupando o 17º lugar, com taxa de 3,7 e em termos absolutos ficou na décima posição.

O estudo observa a frequência dos crimes nas capitais, e em termos relativos: Porto Velho ficou com a maior taxa por 100 mil, 12,4, e Brasília a menor, 1,7; em números absolutos a primeira posição ficou com São Paulo com 153 crimes contra mulheres e Fortaleza com 68, ficou na sétima posição. O mapa apresenta esses crimes por município, tendo considerado apenas aqueles com população feminina acima de 26.000, o que corresponde a 578 municípios.
Observando a idade das vitimas, 28% tem idade entre 15 e 59 anos, sendo a faixa etária de maior incidência, a de 20 a 29 anos com 7,7%, representando 1.331 crimes para o ano de 2010.

Os feminicídios têm desafiado movimentos feministas e governos comprometidos com a garantia dos direitos das mulheres à vida, e a uma vida sem violência. Esse pode ser, no momento, o centro da questão dos direitos humanos das mulheres, tema definitivamente consolidado na agenda política internacional.

Os Estados que se comprometem com a adoção de políticas públicas e medidas adequadas e apropriadas para assegurar os direitos humanos das mulheres devem incluir em suas ações a implementação de sistemas de informações eficientes para investigar as condições desses crimes. No Brasil, como em diversos países do continente latino americano, esses estudos não estão sendo realizados pelo Estado. Mas, combater e punir requer conhecer.
Na medida em que nos adentramos na investigação sobre as mortes violentas de mulheres, especialmente àquelas decorrentes de conflitos amorosos ou sexuais percebemos novas dimensões que desafiam o conhecimento. Embora sejam assassinatos quase sempre cometidos por maridos, ex-maridos, namorados e ex-namorados, decorrentes de situações de rupturas do relacionamento ou de ciúme, ocorrem outras modalidades também em circunstancias de gênero, além de vitimarem outras pessoas como filhos, parentes e amigos das mulheres que estão na mira da violência. É urgente a criação de um sistema de informação nacional sobre feminicídio no Brasil, para fundamentar a reflexão de sua tipificação penal neste momento em que se discute um novo Código Penal Brasileiro. Discussão que já está na pauta de quase todos os países da América Latina e do Caribe.

O feminicídio deve ser tipificado como crime hediondo, decorrente de motivações de gênero, triplamente qualificado como fútil, traiçoeiro e cultural, sem direito a fiança e nem recurso.


Com informações do jornalista Daniel Fonseca
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quarta-feira, 27 de junho de 2012

Feministas lançam carta de repúdio a cobertura da imprensa nos casos de violência contra a mulher


CARTA ABERTA À IMPRENSA


João Pessoa, 27 de junho de 2012

Prezados/as,

Vimos, através desta carta, manifestar nosso repúdio à maneira que a imprensa tem noticiado os casos de violência contra a mulher no estado da Paraíba, em particular, sobre as imagens utilizadas para ilustrar as matérias.

Não podemos aceitar a maneira que as mulheres estão sendo expostas pela mídia, o que acreditamos reforçar ainda mais esta violência a que somos submetidas no dia a dia.  Entendemos que tais imagens, com corpos mutilados, sem roupas, com tarja nos olhos, entre outras, reforçam a humilhação das vítimas, no que diz respeito aos crimes de caráter machista ou de violência de gênero, e estimulam ou ao menos recompensam aqueles que os cometeram. A humilhação da vítima, seja para lavar a honra, seja para obter prazer (no caso dos estupros) é sim, e não podemos calar quanto a isso, um dos motivos que levam seus algozes a cometê-los.

A imprensa também colabora com a ideia de que a mulher precisa ser "protegida", fazendo com que a sociedade insista na falsa ideia da fragilidade inerente ao nosso gênero.

Precisamos sim, ser protegidas, mas não por homens e pelo comportamento "correto", que em muitos textos é reforçado como uma espécie de redutor da violência contra as mulheres, e sim por leis, igualdade e justiça. Também pelos veículos de imprensa, que têm que divulgar, sim, a violência contra a mulher, que vem alcançando índices alarmantes nos últimos anos.

Frisamos: só em 2012, 73 mulheres foram mortas na Paraíba, segundo dados oficiais divulgados pela Secretaria de Segurança Pública do Estado.

Mas, lembrando, que a mídia é formadora de opinião, identidades e valores, e, portanto, deve prezar pela ética,  respeito à dignidade humana, e às leis que regem este país, fazendo valer a sua responsabilidade social.  
Insistimos que não é preciso recorrer à comunicação do grotesco para informar qualquer fato. Além das imagens, a imprensa da Paraíba tem produzido textos que reforçam a discriminação contra a população pobre, principalmente, quando noticiam mortes que supostamente podem estar relacionadas ao tráfico de drogas, ligando a morte das mulheres ao tráfico e, subjetivamente, afirmando que “ela deveria morrer, pois significava um problema para a sociedade”. A apuração dos fatos, ouvir TODOS os lados envolvidos nos acontecimentos é lição básica que aprendemos na universidade e que não podemos esquecer.

No dia em que a professora universitária, Briggída Lourenço, foi assassinada, alguns veículos de comunicação da Paraíba veicularam imagens dela morta, deitada de costas no chão de seu apartamento e de Elizabeth de Lima dos Santos, que foi assassinada em Mamanguape. Tais imagens violam a privacidade e a integridade das vítimas e em nada contribuem para a denúncia da violência contra a mulher! Reforçamos: ÉTICA DEVE FAZER PARTE DO FAZER JORNALÍSTICO! A profissão tem um Código de Ética que deve ser observado e colocado em prática!

O uso destas imagens viola o artigo 5º, parágrafo X, da Constituição Federal que diz: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”; e ainda, no mesmo artigo, parágrafo V: “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além de indenização por dano material, moral ou à imagem”. Só para citar uma das diversas legislações brasileiras que preveem responsabilidades aos órgãos que violarem a imagem da pessoa.

Entendemos que qualquer continuidade nessa linha de jornalismo, que consideramos sensacionalista e ineficaz, além de ferir os nossos esforços na mudança e conscientização da população acerca dos crimes de gênero, como uma atitude a ser denunciada e combatida.



ASSINAM:


Marcha das Vadias – PB

Cunhã – Coletivo Feminista/PB

Bamidelê – Organização de Mulheres Negras na Paraíba

Coletivo Feminista Teimosia/PB

Ilê Mulher – Porto Alegre/RS

Rede de Mulheres em Comunicação

Grupo de Mulheres Negras Nzinga Mbandi/SP
Associação de Mulheres Flor de Maio
Grupo de Mulheres Negras Saltenses
Associação de Mulheres Negras Acotirene
Associação de Mulheres de Araras/SP
Movimento Pela Saúde dos Povos/PHM Brasil
Rede de Mulheres em Articulação na Paraíba
Sandra Vasconcelos – jornalista
Frente Feminista do Levante
Assembleia Nacional de Estudantes - Livre (ANEL)
Letícia Fernandes Resck – atriz e feminista independente
 Centro de Ação Cultural - CENTRAC


Observatório da Mulher
 Associação das Trabalhadoras Domésticas de Campina Grande – PB
Coletivo Feminino Plural
ELAS POR ELAS - VOZES E AÇÕES DAS MULHERES/SP

- MCTP - MOVIMENTO NACIONAL CONTRA O TRÁFICO DE PESSOAS/SP
Fórum Nacional de Mulheres Negras

CEN - Coletivo de Entidades Negras

Sandra Muñoz – feminista
Eunice Gutman - Via TV Mulher
Sulamita Esteliam, jornalista e escritora 
blogue A Tal Mineira - Recife-PE

O Geledés – Instituto da Mulher Negra

 Articulação de ONGs de Mulheres Negras Brasileiras
Jeanice Dias Ramos, jornalista, Porto Alegre/ RS


Tatiane Scherrer - Orçamentista Grafica – Limeira/SP
Terezinha Vicente - Ciranda Internacional da Comunicação Compartilhada
Associação Cultural e Recreativa ANO AZUL /PB
 Bloco do Universo feminino AS ANJINHAS /PB






 




quinta-feira, 21 de junho de 2012

Os homens que não amavam as mulheres e a Riot Grrrl Lisbeth Salander


 Por Mabel Dias

                                                Noomi Rapace

No começo deste ano, chegou as telas brasileiras o segundo filme da trilogia Millenium, “Os Homens Que Não Amavam As Mulheres”, em sua versão americana, dirigida por David Fincher.

A primeira versão da trilogia, escrita pelo jornalista Stieg Larson, um workaholic nato, foi lançada em 2009, porém, não traz o mesmo vigor da americana que já na abertura provoca um forte impacto no espectador. Imagens cibernéticas embaladas pelo som da banda Led Zeppelin nos fazem entrar, fascinantes, na história do jornalista Mikael Bloomkvist e da hacker e riot grrrl (porque não?) Lisbeth Salander, que em um determinado momento se juntam para investigar o desaparecimento da sobrinha-neta de um empresário sueco. Não haveria melhor pessoa para investigar o sumiço de Harriet Vanger do que Lisbeth. Além de uma ótima investigadora, Lisbeth Salander sentia na pele a misoginia e a violência que esta causava às mulheres. Em pouco tempo que está na investigação, ela já descobre o porquê o assassino cometia os crimes: ódio às mulheres.

Ao lado de Bloomkvist, ela vai desvendando, não apenas o sumiço de Harriet, como também começa a descobrir uma série de assassinatos de jovens mulheres na época em que os nazistas estavam no poder. E na Suécia de 1940 os nazistas tocavam o terror, o que não era diferente em outros países.
Apesar de não ser tão dinâmico quanto o americano, a versão sueca dos “Homens Que Não Amavam As Mulheres”, dirigida pelo dinamarquês Niels Arden Oplev, também traz uma boa interpretação da personagem Lisbeth, incorporada pela atriz Noomi Rapace. Na americana, é a atriz Rooney Mara, que dá vida a riot grrrl e até ganhou o Oscar de melhor atriz pela sua Lisbeth Salander.

Sem dúvida, as cenas mais chocantes de ambos os filmes, são a do estupro que Lisbeth sofre por parte de seu tutor. É nojento, repugnante! No filme mais recente, além do estupro, ela é obrigada a fazer sexo oral em seu tutor. Ao invés de denunciar ao Estado a violência que sofreu, Lisbeth pratica uma ação direta impressionante. Depois de torturar seu agressor, ela tatua no peito dele a frase “Sou um porco estuprador”.  Seria um recado indireto para dizer que não acredita no Estado?

A trilogia Millenium que deveria ter sido uma decalogia não fosse a morte prematura de seu autor, Stieg Larson, é muito bem escrita e elaborada. As duas versões cinematográficas trazem um belo roteiro e uma impecável produção. A versão americana traz um novo final onde o assassino das cinco mulheres judias (diga-se de passagem) é o irmão de Harriet, Martin Vanger, sobrinho neto de Henrik Vanger, o empresário que contrata o jornalista Mikael Bloomkvist para encontrar sua sobrinha desaparecida há 40 anos. E Harriet não está morta, apenas assumiu uma outra identidade para fugir da violência que era submetida, primeiro pelo seu pai, e depois da morte dele, pelo seu irmão, Martin.

Lisbeth Salander dá o toque especial aos dois filmes. Pelo seu visual dark/punk quanto por sua inteligência e anti sociabilidade. Ela não sorri e não quer fazer amigos. Mas se pudermos conviver mais de perto com Lisbeth, percebe-se que ela é fascinante e encantadora. Stieg Larson ao criá-la pode desconstruir o estereótipo do visual punk, apesar de dar-lhe uma personalidade agressiva. O autor do livro Millenium, que deu origem aos dois filmes, dá dicas do porque do comportamento anti social da hacker, e tudo parece ter origem na sua adolescência.  Depois de estabelecer um vínculo maior com seu parceiro de investigação (e em seguida um vinculo amoroso), Lisbeth abre o jogo e conta que vive sob a tutela do Estado porque aos 12 anos tentou matar o pai, queimando-o vivo. Mas ela não revela o motivo. Ou não haveria?
                                               Rooney Mara

Só sei que vale muito a pena assistir a nova versão de “Millenium – Os Homens Que Não Amavam as Mulheres”, e assim como a sua edição sueca. Melhor ainda, é conseguir o livro e devorá-lo, pois com certeza muitas outras histórias serão desvendadas. Não só a da riot grrl Lisbeth Salander.

terça-feira, 19 de junho de 2012

Direitos das mulheres, da juventude, de grupos LGBT e Trans ameaçados na Rio+20!

Desde o dia 13 de Junho negociadores oficiais dos países-membros e autoridades observadoras da ONU têm se reunido sistematicamente ao longo do dia (e da noite) no centro de convenções Riocentro, no Rio de Janeiro (RJ). O objetivo destas reuniões é chegar num consenso sobre o documento final da 2ª Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, popularmente conhecida como Rio+20. A alcunha vem do fato de que a primeira conferência, realizada também no Rio, foi realizada em 1992, há 20 anos atrás.

A Agenda21, estabelecida nesse primeiro momento, trazia uma série de avanços importantes em relação aos direitos humanos, direitos das mulheres, da juventude, e direitos sexuais e reprodutivos. Esta pequena vitória foi fruto de fortes articulações entre lobistas, ativistas e negociadores ligados a movimentos de mulheres e movimentos feministas durante tal processo.  Na Rio+20, que deve se encerrar nesta sexta-feira, porém, a história tem sido outra. O bloco de países G77, apoiado pelo Vaticano, tem ameaçado seriamente o futuro dos direitos sexuais e reprodutivos nas discussões sobre o texto do documento final da Rio+20.

Mas como? O documento não é só um pedaço de papel?
Não. O “pedaço de papel” que é esse documento final é uma espécie de orientação geral dos países-membros da ONU (a grande maioria no mundo) para diversos tipos de política. A ONU não é um governo de todos os governos e não está acima de nenhum deles. É como se fosse um grêmio de todos os governos, um espaço diplomático onde chega-se a consensos, acordos e orientações comuns. Os governos, portanto, são a ONU. São eles que fazem a ONU. Esse documento indica, portanto, a linha política que será reforçada. Governos se comprometem com ele e ele pode ser cobrado. Existe portanto uma importância política neste processo.

Mas o que exatamente está acontecendo com os direitos das mulheres e da juventude na Rio+20?
Na ONU, as cláusulas e resoluções são definidas por consenso primordialmente nas negociações, realizadas por negociadores oficiais dos governos. Um texto final é encaminhado aos chefes de Estado (como a Dilma) para que estes então aprovem e/ou revoguem trechos, se preciso votando. Há muita articulação, porém, por trás disso, para que eles cheguem lá na hora e sustentem a linha que os negociadores vinham seguindo. Em geral, os pontos que são consensuais nas negociações prévias são apenas aprovados, enquanto pontos destacados pelos comitês de negociação como não-consensuais são rediscutidos e votados. Pois é isto que está, neste exato momento, acontecendo.

O texto que está até então aprovado, contestado pelo Vaticano e G77 diz mais ou menos o seguinte sobre “Saúde e População”:

“Reivindicamos a complete e efetiva implementação da Plataforma de Ação de Pequim, do Programa de Ação da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento e as resoluções de suas conferências de revisão, incluindo os comprometimentos que buscam a saúde sexual e reprodutiva e a promoção e proteção de todos os direitos humanos nestes contextos. Enfatizamos a necessidade de que se providencie acesso universal à saúde reprodutiva, incluindo planejamento familiar e saúde sexual, assim como a integração da saúde reprodutiva em estratégias e programas nacionais.

Nos comprometemos a reduzir a mortalidade maternal e infantil, e melhorar a saúde das mulheres, homens, jovens e crianças. Reafirmamos nosso compromisso com a igualdade de gênero e a proteção dos direitos de mulheres, homens e jovens a terem controle e decidirem livremente e responsavelmente sobre sua sexualidade, incluindo acesso à saúde sexual e reprodutiva sem coerção, discriminação ou violência. Trabalharemos ativamente para garantir que os sistemas de saúde ofereçam a informação e os serviços necessários relativos à saúde sexual e reprodutiva das mulheres, buscando inclusive o acesso universal a métodos de planejamento familiar modernos e aceitáveis, que sejam seguros, efetivos e economicamente viáveis, uma vez que isto é essencial para a saúde das mulheres e para o avanço rumo à igualdade de gênero.”

A proposta do G77 (bloco de países) e do Vaticano é cortar o primeiro parágrafo aqui citado por inteiro e, como se isso não bastasse, retirar as especificações em relação a “jovens” do segundo. No texto original a especificação “adolescentes” ainda figurava, mas esta batalha já perdemos. O que preocupa todas e todos as ativistas e os ativistas de gênero, direitos humanos e juventude é perder esta especificação. Pra fechar com chave de ouro, estes governos do G77 e o Vaticano ainda querem cortar as menções à “saúde sexual de reprodutiva” e substituir somente por “saúde”, e cortar tudo que fala de “planejamento familiar”.

E eu com isso?

Como é notório pelas últimas políticas propostas no Brasil sobre o tema, como o Projeto Cegonha, cadastro de gestantes, a proibição do parto em casa e agora pelo Estatuto do Nascituro, já estamos em vias de sofrer estes ataques e termos nossos direitos (ao próprio corpo, à própria gravidez, etc) tirados. Para além das mulheres cissexuais, que em geral têm a possibilidade de engravidar, o texto como querem Vaticano e G77 ainda são nocivos para outros grupos como transexuais, homens e mulheres jovens, adolescentes, comunidade LGBT, etc. Sem estas poderosas menções, não teremos comprometimento oficial nenhum de nosso governos – e de outros – com estas questões que afetam diretamente nossas vidas.

Mas o que posso fazer?

No momento, a pressão precisa ser feita diretamente sobre chefes de Estado, para que não deixem estas modificações serem aprovadas. Aqui no Brasil, especificamente, precisamos que a opinião pública se fortaleça contra estes cortes, fazendo com que nossa Presidenta Dilma Roussef e sua equipe de governo não aceitem esta atrocidade e mantenham-se firmes durante as negociações.
Para isto, repasse estas preciosas informações. Tuite sobre isso, escreva sobre isso, reposte este e outros textos que encontrar sobre o assunto. Envie estas informações a pessoas influentes ou não, comunicadores, jornalistas, veículos de comunicações, blogueiros, ONGs, movimentos sociais. A internet tem sido uma poderosa ferramenta de pressão no Brasil e chegou a hora de a usarmos novamente.

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Camila Silveira

Contatos:
twitter: www.twitter.com/camilace
(85)8866-6035

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Fórum de Mídias Livres acontece na Cúpula dos Povos Rio +20

Centenas de representantes das mídias livres começam a chegar ao Rio de Janeiro  para  a Cúpula dos Povos da Rio+20, evento paralelo à Conferência da ONU sobre desenvolvimento sustentável. Trabalharão para difundir a voz dos povos reunidos na Cúpula e, em vez de falar em manejo do meio ambiente pelo poder econômico, falarão em caminhos para a justiça ambiental e social. Essas mídias terão uma agenda própria dentro da Cúpula, onde se encontrarão para realizar o II Fórum Mundial de Mídias Livres, além de cobrir as atividades e os temas da Rio+20.

Feministas de todo o mundo levarão a visão das mulheres, segmento que teve sua voz excluída da História por séculos, enquanto cuidavam da produção e reprodução da vida.  Elas serão protagonistas nesta Cúpula pelo direito à informação e à liberdade de expressão, pelo conhecimento livre e por  outra comunicação que sirva às comunidades, à cultura e à diversidade. Base de todos os movimentos sociais, as mulheres tem mostrado sua força nas últimas grandes ações transformadoras da História, seja na Primavera Árabe, nas mobilizações europeias  ou nas lutas em curso nos países pobres do sul do planeta.

O feminismo sabe que o patriarcado e o machismo são sustentáculos do capitalismo, assim como a mídia oligopolizada que propagandeia os valores que perpetuam a opressão ao feminino.   As mulheres compartilham e defendem o bem comum e a liberdade de expressão para todos e todas, não apenas para as empresas que dominam o setor.  “Mulher, Mídia e Bens comuns” é o painel específico no II FMML, que agora será na Escola de Comunicação da UFRJ.  Vejam nas matérias como as mulheres bem ocupam espaços na comunicação pública.   Teremos nosso espaço  na Rádio Cúpula,  e com certeza utilizaremos o Laboratório de Comunicação Compartilhada, espaço livre para produção, edição e publicação de forma colaborativa.